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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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terça-feira, 21 de setembro de 2010

Idiotas existem: tento não falar deles, mas eles aparecem, assim de repente...

Algumas pessoas já reclamaram deste blog, ou deste blogueiro, por se referir ocasionalmente a certas pessoas como sendo "idiotas". Compreendo, embora não admita.
Ou seja, entendo que algumas almas sensíveis, algumas pessoas cordatas, se sintam chocadas ao lerem uma acusação assim brutal, embora eu sempre tenha dito que estou atacando as ideias defendidas por essas pessoas, não elas mesmas, a quem, diga-se, eu sequer conheço.
Pode até ser que para outras coisas, para as coisas normais da vida, digamos assim, elas não sejam idiotas, do contrário dificilmente teriam conseguido ter "ideias" repercutidas em meios mais vastos, terminando por me encontrar no vasto espaço cibernético.
Como eu leio um pouco de tudo, entre imprensa escrita, falada, visualizada e transmitida em redes, sou mais suscetível de tropeçar com "ideias idiotas", transmitidas por pessoas que eventualmente, na vida normal, não o são.
Prometi, portanto, aos mais sensíveis, não mais chamar os outros de idiotas, e de apenas referir-me às suas ideias, quando eles as têm...
Mas, o que posso fazer quando os idiotas cruzam, asi no más, na "sua" frente, como quem não quer nada, surgindo, justamente, do nada para oferecer ideias idiotas ao resto da humanidade?
Difícil não chamar um indivíduo assim de outra coisa que não um idiota.
É o caso, por exemplo, desse "historiador" -- nada justifica o título -- britânico, que tenta provar que o Holocausto não existiu.
Ademais do aspecto criminoso -- em alguns países -- em veicular tais "ideias", existe também o lado da idiotice mental, evidente numa pessoa com tais "argumentos".
Devo dizer, por sinal, que sou contra a criminalização de tipo de atitude: desde que a pessoa não incite à perseguição, à violência racial, à discriminação ativa, ao ódio entre etnias, desde que suas ideias não provoquem tumultos, vítimas, violência, creio que todo cidadão tem o direito de expressar toda e qualquer ideia, mesmo as mais idiotas.
Eles se expõem, assim, a serem ridicularizados, inclusive por mim, que tenho todo um programa de detecção e denúncia de ideias idiotas.
Com vocês a matéria do Le Monde sobre um idiota consumado.
Paulo Roberto de Almeida

Une association polonaise porte plainte contre le négationniste britannique David Irving
Le Monde, avec AFP, 21.09.2010

Entrée du camp de concentration d'Auschwitz

AFP/VALERY HACHE

Une association polonaise Otwarta Rzeczpospolita (République ouverte) a porté plainte contre l'historien négationniste britannique David Irving qui a annoncé sa visite en Pologne. Selon un communiqué publié sur le site Internet de l'association, l'historien a commis le "crime" [de négationnisme] en tentant de minimiser les atrocités nazies et d'exonérer Adolf Hitler de sa responsabilité dans les camps de la mort, dans son livre paru en 1977, intitulé Hitler's War (La guerre d'Hitler), et qui a été édité en Pologne l'an dernier.

"Je me trouve à présent à Varsovie et je ne suis pas libre de discuter de mon itinéraire pour des raisons de sécurité, comme vous le comprenez sûrement, a déclaré à l'AFP par téléphone M. Irving. Je serai en Pologne pendant les neuf prochains jours", a-t-il précisé, confirmant les informations affichées sur son site Internet annonçant un tour guidé d'une semaine en Pologne sur les lieux liés à la seconde guerre mondiale et à l'Holocauste, du 21 au 29 septembre. Dans une brochure publiée sur son site Focal point publications, M. Irving qualifie cette visite de neuf jours de "voyage inoubliable" et d'opportunité de voir "la vraie histoire".

Selon l'agence polonaise PAP, M. Irving se trouvait lundi à Cracovie, dans le sud du pays. "N'attendons pas le moment où David Irving commettra un nouveau crime sur le territoire de la République de Pologne. Les preuves indiquent clairement qu'il a déjà commis ce crime", écrit l'association dans une plainte en justice adressée à l'Institut de la mémoire nationale (IPN), chargé de poursuivre les crimes nazis et communistes contre les Polonais.

En Pologne, le négationnisme ainsi que la propagation du nazisme et de l'antisémitisme sont passibles d'une peine allant jusqu'à trois ans de prison. David Irving, qui a été condamné en Autriche en 2006 à trois ans de prison, puis expulsé vers la Grande-Bretagne pour avoir nié la réalité de l'Holocauste, a accusé la semaine dernière la Pologne d'avoir transformé le camp allemand nazi d'Auschwitz en un site touristique "ressemblant à Disneyland", devenu "une machine à faire de l'argent". L'historien a émis ces critiques alors qu'il faisait la promotion d'un voyage accompagné en Pologne. Ce voyage prévoit notamment une visite du bunker de l'état-major d'Hitler à Ketrzyn, du quartier-général du chef des SS Heinrich Himmler (Pozezdrze) et du camp de la mort de Treblinka.

terça-feira, 13 de abril de 2010

2094) Holocausto: nunca esquecer, jamais

Um conto de quem esteve no inferno, e miraculosamente, sobreviveu...

Eu nunca estive lá. Será?
Beyla Genauer*
Originalmente publicado no livro Galo de Chagall (1994)

O último vagão, um trem sem fim. Estávamos espremidos como sardinhas em lata. Uso esta expressão porque ela é universal. Não sei como descrever estes vagões sem janelas, sem portas, sem frestas, sem ar, carregados com homens-espantalhos de barbas brancas e compridas. Não eram vermelhas. Como, quer meu amigo. Eram brancas. Eu vi.

E aquelas mulheres vagas, com os lenços amarradas sob os queixos. Não, eles não eram multicoloridos como insiste o mesmo amigo. Eram negros. Eu vi. Não vi crianças. Onde estariam? E eu, como fui parar lá? Não sei. E meu pai? E minha mãe? E meus irmãos? Onde estariam? Não sei.

Os homens eram altos, muito altos. Magros, muito magros e todos iguais. Listas. Vestiam listas. Não, não eram como roupas de prisioneiros, que são listadas. Uma espécie de caftans com listas. Listas como as da túnica de seda de José, filho de Jacó. Sim aquele da Bíblia. Aquele que os irmãos venderam aos egípcios por puro ciúme. Aquele que perdeu a túnica nas mãos da mulher de Putifár ao fugir dos seus anseios sexuais.

As rodas do trem ecoavam listas, li-tas, li-tas, li-tas. Na cabeça os homens não tinham solidéus, o que seria próprio. Ostentavam algo entre sztreimel-casquete-capuz de Klu-Kux-Klan. E os olhos! Olhos de judeus, olhos de judias. Grandes, assustados, apavorados, enterrados na cabeça com olheiras negras que chegavam até as barbas, até os lenços.

Confinados em trens de gado. Gado pensa? Não sei. Mas eu, confinada, comecei a pensar. Penso, logo existo. Se existo, preciso agir. Fazer o que? Fazer o que? Fazer o que? As rodas do trem começaram a falar, registrar, registrar, registrar, re-re-re-gis-gis-gis, trar-trar-trar. Esta é, então, a minha tarefa?!

Comecei a me esgueirar de um vagão para o outro. Espremia-me por entre a massa de espantalhos e estendendo as mãos implorava: lápis e papel, lápis e papel. O trem continuou rolando e as rodas do trem ecoando, la-pis e pa-pel, la-pis e pa-pel.

Nenhuma presença da policia, mas o medo dela pairava na falta de ar do trem. Proibido escrever. Apagar a memória. Apagar. A-pa-gar, memória, memória, me-mo-ri-a, me-mo-ri-a, a-pa-gar, ga-gar-gar-me-me-mó-mó-mó-ria-a-ri-a ri-a!

Os trapos humanos iam estendendo-me, sorrateiramente, uns tocos de lápis, uns pedaços de carvão, uns pedaços de papeis sujos, pedaços de cartolinas sebentas, postais velhos e amassados, retratos amarfanhados, quem sabe de entes queridos. Testamentos. Testemunhas. Eu? As rodas ecoavam. Você, você, você, você, você.

- Guarda menina, esconde bem!

- Tudo em silêncio, sem som. Eu lia seus lábios descarnados.

- Prometo, prometo, escondo, escondo. Pro-me-to, es-con-do, pro-me-to.

Trêmula, eu prosseguia. Balançava a cabeça em sinal de agradecimento, enfiando tudo na minha roupa de baixo, mais imunda que os papeis que recebera. Os tocos de lápis me espetavam, arranhando os meus seios que mal começaram a desabrochar. Desvairada, continuava para o próximo vagão. Tudo se repetia. Tudo em silêncio. Consciente do perigo. Pe-ri-go. Si-i-len-cio. Sh-shu-sh-sh-sh-s-s-s.

Lentamente o rolar das rodas foi diminuendo. Parou. É agora! É agora que eles vão subir! Vão me revistar! Eu estava pronta para o sacrifício como o Isaac no Monte Moriah. Mas e os outros? E os meus papeis?!

Deus de Abraão, de Isaac e Jacó, não permita que eles sejam incriminados pelo meu desatino. A minha prece por Deus foi ouvida e o milagre do Moriah se repetiu. Nada. Ninguém subiu. Silêncio tumular. Ninguém sabe o que ainda pode acontecer, melhor é eu voltar para o meu vagão.

Comecei a arrastar-me de quatro para o último vagão. Outro milagre. Num canto, bem no fim do vagão, no meio de todas as barbas brancas, reconheci a barba branca do meu avô. E aqueles olhos meigos, amendoados, sorrindo para mim, exatamente como lá em Tarkov, quando me metia estouvadamente, intrometendo-me entre a sua barba branca e a Guemarah.

- Vovô me dá cinco groshen para comprar balas, dá?

- Claro sheifale claro.

Eu era a única neta que ousava perturba-lo, quando ele estava perdido em seus estudos talmúdicos. Minha mãe enrubescia, com o meu comportamento moleque.

Suja, estufada, agarrei-me a ele e comecei a soluçar.

- Zeide, zeide, zeide.

- Sh sheifale sh.

- Quando isto acabar, eu, tudo vou contar! .

- Sim carneirinho, sim.

- Eu te amo muito zeide.

- Silêncio carneirinho, silêncio.

Súbito, comecei a ouvir novamente as rodas do trem, mas não sentia o menor movimento, o barulho das rodas tornava-se cada vez menos audível. Lápis e pa-pel, lá-pis e pa-pel-mor-te-m-o-r-t-e, m-o-r-t-t-e-e-e-e-e.

- Zeide, desligaram nosso vagão.

- Shmá Israel Adonai eloheinu adonai Echad.

Dei um berro vindo do útero. O esforço me acordou, eu estava sozinha numa confortável cama, em um hotel de cinco estrelas, em Copacabana. Meu único filho estava cantando no coro de uma igreja, em Santana.
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*Beyla Genauer é atriz e escritora. Publicou os livros de contos curtos Levantar Voo, Galo de Chagal e O Lobo, todos esgotados. É casada com o jornalista Nahum Sirotsky.