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sexta-feira, 14 de julho de 2023

O novo, e grande, capitalismo empresarial brasileiro - Vinicius Torres Freire (FSP)

 O Brasil é o agro, e o agro é o Brasil

Os grandes conglomerados brasileiros atuais em sua maioria tiveram sua origem no agro e na extrativa. Caminha estav certo ao afirmar que nesta terra em se palnatndo tudo dá. Notem que nesses conglomerados também existem empresas emsetores com alta intensidade de capital (CApEX) e razoável gasto em &D sobre vendas uma proxy ara os gastos em inovação. Enfim abre-se uma janela? A conferir.Os novos donos do capital no Brasil e a venda da Braskem

J&F tenta comprar petroquímica e dá outro exemplo da expansão do agro para o topo

Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA)

Folha de S. Paulo, 13.jul.2023

A J&F quer comprar praticamente a metade da petroquímica Braskem. Quem não acompanha o mundo das empresas talvez não se dê conta do tamanho do negócio ou reaja à notícia com desinteresse entediado.

A transação pode ser mais um exemplo de como tem se desenvolvido o grande capital no Brasil e quem são seus novos donos. Trata-se mais uma história de uma empresa do "agro" se expandindo para outras frentes. Quando alguém falar em montadoras de veículos, convém lembrar que entre as maiores companhias do país estão negócios que se criaram a partir da cana de açúcar e da carne. Soja, milho e trigo vêm aí.

A J&F é a holding da família Batista, dos quais os mais famosos são Joesley e Wesley. É dona do JBS, segunda maior empresa do Brasil, por faturamento (segundo o ranking "Valor 1000" de 2022), a maior empresa de carnes do mundo. O BNDES, o bancão federal de desenvolvimento, tem 20,81% da JBS, informa a companhia.

A J&F também é proprietária da Eldorado (de celulose), da Flora (do ramo de farmacêuticos e cosmética) e da Âmbar (energia), entre as 600 maiores do país. Tem também o Banco Original, o aplicativo de pagamentos PicPay e o Canal Rural.

A Braskem é a maior petroquímica do país, 8ª maior empresa. A Petrobras tem 47% do capital votante da companhia; a Novonor tem outros 50%. A Novonor é a Odebrecht (trocaram o nome, por motivos óbvios). A fatia da Novonor é, na prática, dos bancos credores (Bradesco, Itaú, Santander, Banco do Brasil, BNDES).

O negócio da Braskem em si é enrolado e assunto de especialistas em empresas e no setor. O interesse aqui é em mais uma história de expansão do "agro". Parece folclórico lembrar, mas não muito: a JBS começou como um açougue em Goiás, em 1953.

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A terceira maior empresa do país é a Vale, criada pelo Estado e privatizada. A quarta é a Raízen, sociedade entre a Cosan e a Shell, dominante no açúcar e no etanol, na distribuição de combustíveis, lubrificantes, com expansão forte em outras energias renováveis (como solar e biogás).

Alguém aí pensou em "transição verde" e novas tecnologias em energia? Pois então. Essas empresas já estão no centro do negócio e devem ser centrais na mudança.

A Cosan, grosso modo da família Ometto, é a 6ª maior empresa. Criou-se com o negócio de açúcar e álcool. Muito além disso, controla a Compass, que é dona da Comgás, da Sulgás, da ex-Gaspetro (que era da Petrobras) e tem participação em mais de dúzia de distribuidoras de gás. Tem também a Rumo, maior administradora de ferrovias, com terminais portuários e de outras logísticas.

Das dez maiores empresas, cinco são do setor de petróleo e gás: Petrobras, Raízen, Vibra (ex-BR Distribuidora), Cosan (que tem atuação ampla, como se viu), Ultrapar (Ultragaz, Ipiranga etc.). Três são do agro: JBS, Cargill (múlti americana de processamento, fabricação e comercialização de produtos do agro) e Marfrig (carnes). Completam a lista a Vale (mineração) e a Braskem. A siderúrgica Gerdau é a 11ª. A primeira montadora aparece no 19º lugar, a Fiat Chrysler —a próxima é a Volkswagen, em 41º.

As empresas dominantes ou que se tornam cada vez dominantes estão no setor de energia; ou estão e se fizeram no setor de alimentos, no "agro". Várias se expandiram também com a compra de partes do setor estatal de petróleo e combustíveis (na distribuição, na maior parte), são multinacionais, brasileiras ou não, e dominantes em seus mercados. Valem-se ou valeram-se de vantagens absolutas e comparadas do Brasil. Outras ramificações do agro virão. Se vier de fato uma política de "transição verde", é razoável esperar que elas estejam no núcleo da conversa e dos negócios. Convém prestar atenção.


segunda-feira, 21 de março de 2022

Desafios do agronegócio brasileiro no contexto da economia global: entrevista para o Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio - Paulo Roberto de Almeida

Meu trabalho mais recente, na verdade, simples notas para entrevista online, mas na qual desenvolverei outros temas oralmente: 

4108. “Desafios do agronegócio brasileiro no contexto da economia global”, Brasília, 18 março 2022, 6 p. Notas para entrevista online ao Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio, organizado pelo Centro de Estudos de São Gotardo (MG), focando as temáticas da política agrícola, comercial e internacional, assim como as conexões entre agricultura e desenvolvimento; via Youtube: www.cesg.edu.br; dia 21/03/2022; 19:30hs. Disponível em formato pdf na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/81728280/4108_Desafios_do_Agronegocio_Brasileiro_em_um_contexto_de_Economia_Global_2022_). Abaixo a transcrição de meu texto em Word: 

Desafios do agronegócio brasileiro no contexto da economia global

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com; pralmeida@me.com)

Notas para entrevista online ao Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio, organizado pelo Centro de Estudos de São Gotardo (MG), focando as temáticas da política agrícola, comercial e internacional, assim como as conexões entre agricultura e desenvolvimento; via Youtube: www.cesg.edu.br; dia 21/03/2022; 19:30hs.

 

 

1) É fato que o agronegócio brasileiro tem, em muito, se desenvolvido e atinge, hoje, patamar de principal sustentáculo da economia nacional, também, pouco temos dúvidas sobre a capacidade produtiva do país. Infelizmente, porém, às vezes no chocamos com preocupações quanto ao abastecimento de matérias-primas e insumos à produção. Nesse sentido, gostaria de saber, pela sua experiência, como entenderia que a política agrícola brasileira poderia e deveria ser melhor direcionada para mitigarmos esses gargalos?

 

PRA: Depois de quatro séculos sendo um país essencialmente agrícola, mas com base numa agricultura bastante atrasada em seus fundamentos tecnológicos, com pouca interação com os demais setores da economia brasileira e uma ainda mais baixa integração aos mercados mundiais, a agricultura começou a deslanchar a partir dos anos 1970, a partir de um duplo movimento determinado por políticas governamentais: a capacitação do capital humano, sobretudo por parte da Embrapa, mas também nas demais escolas agrícolas, e a conquista do cerrado central, feita tanto pela iniciativa dos novos bandeirantes – em grande medida gaúchos –, como por programas de adaptação daquele bioma à grande agricultura comercial e a uma pecuária extensiva. Não obstante o enorme crescimento da oferta agrícola e dos ganhos de produtividade obtidos desde então, o peso da agricultura também diminuiu na formação do PIB e na incorporação de mão de obra, pois que a indústria também dava um enorme salto a partir dessa época, convertendo esse setor no grande sustentáculo da economia nacional, em termos de emprego, renda e emprego, inclusive no plano do comércio exterior.

A deterioração econômica dos anos 1980 e 90, com a crise da dívida externa e, depois, a aceleração inflacionária subsequente a diversos planos frustrados de estabilização, resultou em profundas mudanças nas políticas macroeconômicas – a partir do Plano Real – e em diversas políticas setoriais, entre elas a agrícola, liberalizando o setor de vários controles e constrangimentos anteriores. A essa altura já tínhamos nos transformado num grande exportador de produtos agrícolas, mas ainda muito relutante no plano das negociações comerciais multilaterais, a despeito de nossa inserção no Grupo de Cairns, dos países exportadores de produtos agrícolas competitivos e não subvencionistas, como Canadá, Austrália e os latino-americanos, ao contrário dos Estados Unidos e da União Europeia (além de diversos outros países, como Japão, Coreia do Sul, Suíça e outros, entre eles a própria Índia e a China). Os ganhos de produtividade e a nova desenvoltura no plano global tornam o Brasil um megaplayer na oferta agrícola mundial, sobretudo depois do término da Rodada Uruguai de negociações comerciais multilaterais, que também aprovou um inédito Acordo Agrícola, que deu início ao desmantelamento gradual das subvenções internas à produção (mas ainda subsistentes) e os subsídios à exportação (progressivamente reduzidos). 

A partir dos anos 2000 o agronegócio se tornou não exatamente um sustentáculo da economia brasileira – os serviços representam 70% do total, mas o peso do conjunto do agronegócio na formação do PIB cresceu de forma exemplar, chegando a mais de 27% em 2021, enquanto a indústria reduzia, sim, sua participação no valor e no emprego –, mas ele se tornou o eixo central dos superávits comerciais e um fator absolutamente essencial na manutenção do equilíbrio das transações correntes, compensando praticamente totalmente o déficit crônico nos serviços do balanço de pagamentos. Ocorreu igualmente uma transformação estrutural no próprio setor agrícola, com cadeias de valor organizadas de forma relativamente satisfatória internamente, e a formação de um complexo agrícola-industrial e de serviços que compõe, sim, um eixo central de política econômica, e até de ganhos políticos e eleitorais, que jamais havia sido tão relevante desde quando o Brasil começou a se industrializar de forma consistente 80 anos atrás. Com a diminuição relativa do peso da indústria no PIB e no comércio exterior, o Brasil voltou a ser um país essencialmente agrícola, como até os anos 1950, mas dotado de um peso, complexidade e modernidade produtiva totalmente moderna e amplamente qualificado nos mercados agrícolas internacionais, ainda que prejudicado por várias deficiências de infraestrutura, de logística adequada e carente de uma necessária e proporcional sustentação financeira (capitalização e securitização) para nossa penetração ainda maior nos grandes mercados de insumos e na oferta de produtos processados, de maior sofisticação, aos consumidores (cortes finos, por exemplo). Ou seja, o Brasil tem um brilhante futuro pela frente no agronegócio.

A despeito desses enormes progressos na frente produtiva e na conquista de novos e prometedores mercados na frente do comércio agrícola, o setor do agronegócio, assim como o da agricultura familiar – grande parte da qual também participa das cadeias de valor do setor na oferta interna e também na grande agricultura comercial de exportação – enfrentam grandes problemas, que têm suas fontes no aprovisionamento interno inadequado de insumos (como os fertilizantes e defensivos) e também na baixa abertura econômica do setor às grandes cadeias de valor internacionais, o que está vinculado à política industrial, assim como a agrícola e comercial. Apesar de sermos um grande competidor externo – um killer como se diz, em quase todas as commodities agrícolas e nos vários ramos das proteínas animais –, somos ainda muito protecionistas internamente, em detrimento e no contexto do Mercosul, assim como em diversas interfaces da economia agrícola mundial. Nesse campo, precisamos acompanhar de forma mais próxima ainda as grandes mudanças que se processam nos mercados agrícolas, de consumo e de insumos, o que significa dispor de adidos agrícolas e de economistas e advogados especializados no setor, observar os debates que se processam na OMC (normas fitossanitárias-SPS, regulamentos aplicados ao setor), na OCDE (comércio agrícola), na FAO (segurança alimentar), Codex Alimentarius (ou seja, sanidade, ou safety), nas cadeias varejistas e nas grandes tradings de comercialização. 

 

2) Em um mercado mundialmente integrado, dificilmente conseguimos visualizar um desenvolvimento econômico de nações sem o apoio e a entrada de capital estrangeiro. Nesse sentido, como o senhor visualiza as atuais relações comerciais brasileiras e quais caminhos visualiza para uma fortificação do Brasil enquanto importante player no mercado agrícola internacional?

 

PRA: O Brasil foi, durante algum tempo, um grande exportador manufatureiro, tanto em produtos industrializados leves, quanto no setor automobilístico, por exemplo, mas, infelizmente, perdeu muito de sua competitividade externa nas manufaturas por erros grosseiros nas suas políticas macro e setoriais, o que praticamente deixou o agronegócio como o grande salvador do balanço de pagamentos. Alguns desses erros estão justamente vinculados a uma introversão no mercado interno dificilmente aceitável para qualquer economia moderna, na era da terceira onda de globalização. Mas o agronegócio apresenta igualmente uma introversão que não se justifica sob nenhum pretexto, inclusive chegando a certas medidas ridículas, como poder a limitação de terras brasileiras por estrangeiros, como se estes pudesse fazer outra coisa senão produzir no Brasil e exportar. 

O Brasil sempre foi um país extremamente protecionista, desde quando recuperamos a liberdade tarifária em 1844, e assim continuou durante o resto do Império e na República, quando uma Lei do Similar Nacional vigorou até os anos 1990. Desde essa época, nos governos Collor e FHC fizemos alguns progressos no caminho de maior abertura econômica e liberalização comercial, mas ainda insuficientes quando vistos em escala comparativa internacional, e mesmo na perspectiva do Mercosul, que se esperava fosse uma plataforma para a projeção externa do Brasil e dos seus sócios, assim como para a maior inserção do bloco na economia global. Mas, desde a era Lula, o Mercosul estagnou, foi transformado em palanque político e até retrocedeu, dadas as discordâncias entre os seus dois principais países com respeito aos acordos de livre comércio – com a União Europeia, por exemplo – ou às grandes iniciativas de liberalização ampliada, como o TPP e o RCEP. Olhando visualmente um mapa mundial das cadeias de valor – que se situam quase todas no Atlântico Norte e na Ásia Pacífico – vemos que o Brasil e o Mercosul participam muito pouco nesses eixos de produção integrada e de intercâmbios globais, e são eles que trazem crescimento econômico, prosperidade e desenvolvimento social. 

Olhando, por exemplo, a recente crise no abastecimento de fertilizantes, registramos vários apelos à conquista da autossuficiência no setor, o que além de impossível, no curto e médio prazo, seria ineficiente no plano puramente econômico. A solução está mais na busca de diversificação de provedores, quando na própria organização interna da produção agrícola, que pode tornar-se menos dependente desses insumos ao se adotar outras técnicas de gestão dos terrenos e dos modos de plantio. Os dois grandes choques do petróleo provocaram uma das revoluções tecnológicas mais relevantes do último meio século, que foi a redução do conteúdo em petróleo nos processos industriais. A agricultura, mediante pesquisas e adoção de outras técnicas, também deveria ser capaz de reduzir sua dependência do NPK; a grande agricultura comercial prefere importar, mas a pequena pode substituir esses compostos.

 

3) A União Europeia é um bloco econômico de relevante força internacional e, em muito, impacta as transações comerciais ao redor do mundo. Nesse sentido, como o senhor visualiza o impacto de restrições efetuadas – a exemplo, produtos brasileiros que utilizam fertilizantes ou agroquímicos – na economia brasileira? O senhor visualiza alguma saída para mitigação desses impactos ou utilização desses de forma favorável ao desenvolvimento econômico nacional?

 

PRA: A UE, segundo maior parceiro comercial do Brasil, possui uma tradição fortemente protecionista na área agrícola, introduzindo critérios nem sempre transparentes na regulação de sua política comercial. Um exemplo é o princípio da precaução, que costuma ser invocado sem qualquer embasamento científico, ou justamente por causa de evidências suficientes quanto à incorporação de hormônio, de agroquímicos ou até de OGMs nos alimentos, para justificar restrições abusivas às compras externas. O caso mais flagrante é justamente o da identificação componentes que já fizeram parte do arsenal produtivo ou defensivo, mas que passaram a ser substituídos por outros, com efeitos pouco conclusivos sobre a saúde humana. Esta é uma batalha que precisa ser vencida pela ciência, nos foros multilaterais apropriados, mas também pela via da elevação constante dos padrões internos de produção, no sentido de evitar a maior barreira ao comércio livre, bem mais do que as tarifas. Mas isso tem a ver também com a questão ambiental, como parece evidente a todos. 

Com efeito, um dos maiores fatores que podem impactar negativamente a interação do Brasil com os europeus na área comercial agrícola é a desastrosa política ambiental do atual governo, que representa um contrassenso inacreditável na promoção do agronegócio responsável, que não tem nada a ver com a devastação amazônica, mas que pode vir a pagar um preço inaceitável se medidas restritivas – não apenas dos europeus, diga-se de passagem – forem adotadas em vista da incapacidade demonstrada até aqui para limitar e reduzir o ritmo do desmatamento e, sobretudo, a ação ilegal de grileiros, garimpeiros e invasores de terras indígenas (ao contrário, o governo Bolsonaro tem feito tudo para estimular a depredação do meio ambiente e a ofensiva contra reservas naturais e territórios indígenas). Esse elemento está na origem da paralização completa do processo de ratificação do acordo UE-Mercosul, que não deve ser retomado até que um novo governo inverta completamente o curso atual; mesmo assim deverá demorar certo tempo para que se configure na prática, não somente no discurso, a inversão da política ambiental suicidaria do governo Bolsonaro. É estranho que o próprio agronegócio brasileiro não tenho tomado iniciativas mais fortes para coibir os crimes que vêm sendo cometidos não apenas contra o meio ambiente e os indígenas, mas também contra o setor mais dinâmico da economia brasileira.

 

4) Quais seriam os novos mercados que o senhor entende deve o Brasil explorar para o desenvolvimento de relações agrícolas mercadológicas?

 

PRA: Estados Unidos e União Europeia são grandes mercados de consumo, mas são também os mais protegidos e também aqueles nos quais o fator elasticidade-renda não tornará a nossa oferta agrícola mais competitiva, uma vez que esses mercados já estão saturados nessa área. Os grandes mercados para o nosso agronegócio estão nos emergentes dinâmicos e nos países em desenvolvimento, de maneira geral, nos quais o crescimento da renda, nos próximos anos, vai requerer um consumo elevado de alimentos, com maior ênfase na proteína animal e nos lácteos. Daí o motivo do agronegócio brasileiro avançar rapidamente no seu próprio upgrade no tipo de produção, não apenas produtos brutos, mas oferta processada e devidamente apoiada em campanhas de marketing quanto à qualidade dos nossos produtos.

Por acaso, os dois grandes mercados nos quais o crescimento da oferta brasileira poderia ser o maior estão justamente nos dois sócios maiores do Brics, China e Índia, mas que são, também, grandes protecionistas e subvencionistas na área agrícola. Temos de ser duros com esses dois gigantes quanto somos como os dois grandes mercados avançados do Atlântico Norte. Por outro lado, a China – diferente da Índia, que tem enormes problemas sociais com respeito à propriedade da terra e tecnologia agrícola, assim como a África – tem avançado enormemente numa espécie de revolução agrícola, que combina capitalização, ciência e tecnologia, uma vez que ela possui pouco espaço naqueles fatores que representam nossa pujança: terra, água e sol. 

Mas, esses mercados não podem ser vistos apenas como absorvedores da oferta alimentar brasileira, pois as barreiras comerciais continuarão a existir no futuro indefinido. O Brasil possui tecnologia e conhecimento suficientes para participar do próprio processe de revolução agrícola em curso nesses países, ou seja, exportando serviços, know-how e diversos outros fatores produtivos, pois que um dos objetivos do agronegócio brasileiro deve ser o da sua internacionalização, tanto na área de grãos, quanto na pecuária. A África apresenta outros tipos de problemas que podem se situar, cronologicamente, no início do processo de modernização agrícola brasileiro, embora alguns desses problemas estejam mais vinculados à propriedade da terra e às relações contratuais do que à tecnologia propriamente produtivo no contexto da agricultura tropical, na qual o Brasil é um verdadeiro campeão.

 

5) Muito se diz sobre o Brasil ser um exportador de insumos e de matérias-primas com baixo valor agregado. Em sua experiência, o senhor vê isso como uma realidade? Se sim, como podemos direcionar nossa política agrícola interna para agregação de valor aos produtos? Se não, como podemos direcionar nossa política para sanar o déficit informacional?

 

PRA: Sim, isso é verdade: o Brasil é um produtor primário, e assim tem sido nos últimos 500 anos. No terreno das vantagens comparativas de David Ricardo –cuja teoria ainda é plenamente válida, independentemente da passagem do tempo – não há nada de errado em explorar plenamente essas vantagens competitivas relativas, não só na agricultura e na pecuária, mas também na mineração, nos recursos florestais e pesqueiros, por exemplo. O upgrade na oferta, ou seja, agregar valor às commodities e oferecer produtos processados e até mais sofisticados, não depende só da vontade do agronegócio, mas de todo um complexo de fatores, de políticas governamentais e da iniciativa privada, assim como da existência de condições mercadológicas externas ao domínio brasileiro. A agregação de valor à oferta agrícola brasileira deve ser um processo concomitante à internacionalização do próprio agronegócio brasileiro, ainda excessivamente introvertido e, portanto, protecionista. Esse processo deveria começar pelo Mercosul, que requer amplo exercício de reformas.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4108: 18 março 2022, 6 p.


sexta-feira, 11 de março de 2022

Geopolítica e desafios do agro brasileiro em tempos turbulentos - Insper-CEBRI, 24/03/2022, 18hs

 Geopolítica e desafios do agro brasileiro em tempos turbulentos

https://www.insper.edu.br/agenda-de-eventos/geopolitica-e-desafios-do-agro-brasileiro-em-tempos-turbulentos/

Insper - CEBRI

24/3/2022, 18h às 20h


Em 2021 o Brasil bateu recorde histórico nas exportações do agronegócio ao ultrapassar os US$ 120 bilhões, número que evidencia a posição do país como um dos principais fornecedores globais de alimentos, apesar de uma pauta concentrada em alguns destinos e, ainda mais, em poucas commodities.

Para 2022, se por um lado as perspectivas são positivas em virtude da retomada econômica pós pandemia, por outro, o setor encerrou 2021 preocupado com o aumento dos custos de produção, e redução de margens do produtor, além da apreensão causada pelo conflito Rússia-Ucrânia.

Estruturalmente é essencial ao setor discutir como ampliar a presença de produtos tradicionais em novos mercados e oferecer novos produtos em destinos tradicionais, buscando maior diversificação e adição de valor da pauta exportadora. Tais propósitos se apresentam ainda mais desafiadores no contexto atual de conflito armado envolvendo dois importantes países no cenário do agro, aumento do protecionismo global, recrudescimento das barreiras sanitárias, técnicas e burocráticas e pressões relacionadas aos esforços de combate ao aquecimento global.

A partir desse panorama, o Insper Agro Global e o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), retomam o seu Ciclo de Debates. Nesse ano o programa será trimestral com inovações no seu formato. Serão debates híbridos, com duas horas de duração para maior aprofundamento dos temas, sempre divididos em dois painéis.

Nesse primeiro debate de 2022, vamos explorar no painel inicial, as tensões, oportunidades e desafios que se apresentam neste momento conflitivo em mercados atuais e potenciais para o agro brasileiro na Eurásia. Para conduzir esse debate contaremos com André Corrêa do Lago, Embaixador do Brasil na Índia e Larissa Wachholz, executiva, ex-assessora da Ministra da Agricultura para assuntos de China e sênior fellow do CEBRI.

No segundo painel especialistas abordarão desafios, oportunidades e estratégias para aprimoramento da pauta exportadora por meio de diferenciação e adição de valor aos produtos. Vamos contar com Flávio Bettarello, diplomata, ex-secretário-adjunto de Comércio e Relações Internacionais do Mapa; Luiz Roberto Barcelos, Diretor Institucional da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) e Sueme Mori, diretora de Relações Internacionais da Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

Será um prazer recebê-los pessoal ou virtualmente!

Programação

Abertura e moderação:

    Marcos Jank – Coordenador do Insper Agro Global e do Núcleo Agro do CEBRI

    Julia Dias Leite – Diretora-presidente do CEBRI


Painel I

Mercados e geopolítica do agro brasileiro na Eurásia

Debatedores:

    André Corrêa do Lago, Embaixador do Brasil na Índia

    Larissa Wachholz, ex-assessora da Ministra da Agricultura para assuntos de China e sênior fellow do CEBRI


Painel II

Desafios da pauta exportadora do agro brasileiro: diversificação e diferenciação


Debatedores:

    Flávio Bettarello, diplomata, ex-secretário-adjunto de Comércio e Relações Internacionais do Mapa

    Luiz Roberto Barcelos, Diretor Institucional da Abrafrutas

    Sueme Mori, Diretora de Relações Internacionais da CNA


domingo, 8 de novembro de 2020

O que o agronegócio deve esperar de Joe Biden? - Marcos Jank (Veja)

 Amigos,

É com grande satisfação que informo sobre o lançamento da coluna AGRO GLOBAL no site de VEJA, que trará análises exclusivas sobre agronegócio, comércio e sustentabilidade realizadas pela equipe do centro Insper Agro Global e convidados, sob a nossa coordenação. Segue abaixo o primeiro artigo da coluna.

Abraço,

Marcos

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O que o agronegócio deve esperar de Joe Biden?

Coluna AGRO GLOBAL no site de VEJA, 07/11/2020. 

Marcos Sawaya Jank*

Impacto do governo Biden no comércio agrícola, China, Amazônia e políticas climáticas. 

Joe Biden venceu as eleições dos EUA e esse é o tema do 1º artigo da nova coluna AGRO GLOBAL do site de VEJA. Vamos analisar o impacto do novo governo sobre agronegócio, comércio, clima e Amazônia, mostrando porque Biden é a melhor escolha para o agro brasileiro.

 

A primeira grande mudança da gestão Biden nas relações internacionais será o resgate da liderança que os Estados Unidos sempre exerceram na coordenação multilateral do mundo, que se inicia já na independência dos EUA com a ação diplomática de Benjamin Franklin e os demais Founding Fathers contra o colonialismo europeu.

 

Para entender o papel histórico dos EUA no mundo, vale ler um livro magnífico que acaba de ser lançado: America in the World: A History of U.S. Diplomacy and Foreign Policy, de Robert Zoellick, que foi representante de comércio dos EUA (USTR) de 2001 a 2005 e depois Presidente do Banco Mundial. O livro analisa o papel que Franklin, Hamilton, Jefferson, Adams, Lincoln, os Roosevelts, Woodrow Wilson, Cordell Hull, Kennedy, Reagan, Bush e outros “líderes pragmáticos” tiveram na construção da diplomacia e da política externa dos EUA. A obra merece ser lida nesse momento crucial e conflitivo da democracia americana.

 

No final da 2ª guerra, o mundo pedia maior coordenação multilateral em temas como garantia da paz, comércio, finanças, desenvolvimento e outros. Os Estados Unidos assumiram posição central na criação de diversas organizações internacionais para promover paz, direitos humanos e solução de conflitos (ONU), finanças e desenvolvimento (FMI e Banco Mundial), comércio (o acordo do GATT, que depois virou a OMC - Organização Mundial de Comércio), saúde pública (OMS - Organização Mundial de Saúde) e muitas outras.

 

O momento turbulento e polarizado que vivemos hoje exige o aprimoramento da capacidade de coordenação dos países em novos temas como meio ambiente, mudança do clima, segurança biológica (contenção de pandemias), saúde pública, segurança cibernética, migração, anticorrupção, transparência e outros.

 

Com o America First, Trump deu as costas para o mundo e abandonou o papel histórico de concertação dos EUA. Em comércio, para agradar o seu público interno Trump propôs medidas enérgicas para “zerar” os principais déficits comerciais que os EUA mantinham no mundo, iniciando negociações país a país como se o comércio fosse um jogo de soma zero, que não é.

 

Pouco a pouco, Trump retirou os EUA da Parceria Transpacífico (TPP), um extraordinário acordo comercial ligando 12 países americanos e asiáticos do Pacífico. A seguir, repaginou o NAFTA à sua maneira, enfraqueceu a OMC ao se recusar a nomear juízes para o órgão de solução de controvérsias e retirou os EUA da Convenção do Clima. Trump se voltou para dentro do país, confrontando não apenas os novos inimigos do Oriente, como a China, mas também os seus vizinhos e aliados mais tradicionais do Ocidente. Na minha opinião, não deu certo.

 

Não há dúvida que Joe Biden vai seguir priorizando os interesses domésticos americanos acima de tudo, começando pela recuperação econômica do país. Mas, ao contrário de Trump, ele construirá a sua política externa a partir das medidas internas que serão adotadas, reduzindo o tensionamento e aumentando a concertação internacional.

 

É neste contexto que enxergo a possibilidade de novas formas de diálogo entre os EUA e a China. Com certeza a rivalidade EUA-China veio para ficar e não vai terminar com a eleição de Biden, até porque a China continuará crescendo rápido e ameaçando a hegemonia americana. Ao final de 2021, a economia chinesa estará 10% maior do que logo antes da pandemia. Os EUA estarão menores.

 

No agronegócio, não há dúvida que o Brasil se beneficiou da guerra comercial EUA-China, que começou logo após as eleições de Trump em 2017, e pode ser prejudicado por um acordo tácito entre as duas maiores potências do planeta. Mas comemorar guerras e disputas hegemônicas nunca foi uma boa ideia para quem só atua em campos laterais. Prefiro acreditar que a construção de regras multilaterais que valem para todos continua sendo a melhor opção do planeta. Podemos perfeitamente incrementar nossas parcerias estratégicas com os EUA e com a China, rejeitando a política de “comércio administrado” proposta por Trump que, espero, não será seguida por Biden.

 

Dentre as políticas de Biden, a que mais deve impactar o Brasil é uma nova postura dos EUA em relação ao tema da mudança do clima, radicalmente diferente da linha seguida por Trump. Meio ambiente, mudança do clima, promoção de fontes renováveis de energia e taxação de carbono estarão no centro da agenda de Biden. Os EUA vão retornar ao Acordo de Paris, colocando o tema da mudança do clima no centro da sua política externa, comercial e de segurança nacional, o que certamente incluirá uma forte pressão para reduzir o desmatamento no Brasil.

 

Muitos dirão que essa é uma agenda negativa para o Brasil. Eu prefiro acreditar que, na toada das pressões comerciais que o agro já vem sofrendo na região Norte, a eleição de Biden apenas reforça a necessidade de completarmos a “lição de casa” que estamos devendo para o mundo há décadas.

 

Estima-se que 95% do desmatamento brasileiro seja ilegal e, portanto, associado ao descumprimento da legislação brasileira. É nossa obrigação resolver esse problema, que começa com a necessidade de regularização fundiária das regiões norte e nordeste do país, que já dura décadas. Segue-se o problema da regularização ambiental, que ainda não foi efetivada, a despeito de o Código Florestal já ter completado o seu 8º ano de vida.

 

A verdade é que a agricultura brasileira é ao mesmo tempo vilã, vítima e solução no tema da mudança do clima. “Vilã” por estar associada ao desmatamento ilegal, que já atinge mais de 10 mil km2 por ano no Brasil. “Vítima” porque a agricultura vem sofrendo com eventos extremos e grandes instabilidades climáticas, como vimos esse ano no país. “Solução” porque acumulamos grandes ganhos de produtividade e dispomos de uma matriz energética limpa e diversificada - composta por diversos tipos de biocombustíveis e energias renováveis - fazemos 2 a 3 safras por ano e muitas outras conquistas qualificam a nossa agricultura como de “baixo carbono”.

 

A pecuária de corte será o setor mais pressionado pela eleição de Biden, pelo fato de que a cria de bezerros é a primeira ocupação agropecuária em áreas recém desmatadas do bioma Amazônico. Mas os biocombustíveis brasileiros, como o etanol de cana-de-açúcar e o biodiesel de oleaginosas, podem ganhar bastante espaço na agenda internacional com a adesão dos EUA ao Acordo de Paris e a renovada pressão pela substituição de energias fósseis por energias renováveis, tema amplamente vocalizado por Biden durante a campanha. Vale lembrar que 73% das emissões de gases de efeito estufa responsáveis pela mudança do clima vem do setor de energia e transportes, e menos de 7% de desmatamentos e mudanças no uso da terra.

 

Em suma, creio que a eleição de Biden levará o governo brasileiro a abrir novos canais de interlocução com o governo americano. Deveria, também, buscar uma equidistância mais prudente da sua política comercial com os EUA e com a China, fortalecendo as nossas duas maiores parcerias estratégias. Apesar de os EUA serem os nossos principais concorrentes no agronegócio global, há muito espaço para ampliar a cooperação com aquele país em temas como segurança alimentar global, inovação, bioenergia e no reforço da coordenação multilateral.

 

Creio que a principal lição que deveríamos aprender com o retorno dos Democratas ao poder nos EUA é parar de insistir em ver o mundo como “cruzadas maniqueístas”, de uma luta permanente do bem contra o mal entre supostos poderes opostos e incompatíveis. Em vez de louvar amigos e atacar inimigos imaginários, melhor faríamos em identificar claramente os nossos interesses externos e desafios imediatos. Se fizermos isso, veremos que o nosso maior desafio é simplesmente fazer direito a “lição de casa”. Isso vale para as reformas internas prometidas, e ainda não realizadas. Vale também para os problemas ambientais e fundiários do bioma Amazônia, que agora terão de ser resolvidos, para o bem ou para o mal.

 

(*) Marcos Sawaya Jank é professor de agronegócio global do Insper.

terça-feira, 13 de outubro de 2020

A nova hegemonia do agronegócio no Brasil atual - Stephen Kanitz (junho 2020); comentário Paulo Roberto de Almeida

O texto é do Kanitz (de junho último), é interessante, mas impressionista, e foi feito, como vários outros dele, para impactar, de forma enganosa, aqueles que não conhecem verdadeiramente o completo primário-industrial-científico e de serviços do agronegócio brasileiro. 

Isto se deve em parte à passagem da agricultura atrasada  do Brasil tradicional a uma baseada em produtividade na era militar (em grande medida identificada com a Embrapa, hoje menos relevante) e em grande medida aos NOVOS BANDEIRANTES, que são os gaúchos que passaram a ocupar as área de fronteiras agrícolas do vasto interior brasileiro. 

Em nossa infância, era uma vergonha ouvir que o Brasil era um país "essencialmente agrícola", preconceito contra o qual se batia Eugênio Gudin, que lutava para que o Brasil explorasse suas vantagens comparativas absolutas e relativas, pela modernização da agricultura. Ganhou teoricamente o debate com Roberto Simonsen, mas perdeu na prática para o grupo dos industrialistas protecionistas e militares estatizantes, todos eles partidários do stalinismo industrial (para os ricos) que tivemos desde JK e intensificado na era militar. 

Mas não nos iludamos; o vibrante agronegócio brasileiro, vitorioso como é na competitividade externa, é tão, ou mais, protecionista do que seus colegas industriais, que estão na base da nossa "indústria infante", hoje com 70 anos. A visão desenvolvimentista de muitos economistas brasileiros se identifica em parte com o stalinismo industrial dos militares, ao passo que Xico Graziano (ver postagem anterior neste blog) é propenso a esconder o protecionismo agrícola dos capitalistas do campo. O Brasil continua a ser um país avestruz.

Paulo Roberto de Almeida

Entenda Essa Crise Política. É o Poder Mudando de Mão.

Essa súbita polarização na política, que deve estar assustando muita gente, é na realidade um fim de ciclo.

O poder reinante nesse país nos últimos 25 anos está sucumbindo, lutando com todos os seus meios para impedir o inevitável.

Usam jogo sujo sim, mas é por puro desespero. Acreditem.

Quem está perdendo miseravelmente nesses últimos 30 anos são as indústrias, os sindicatos, os trabalhadores de chão de fábrica, as grandes cidades, os industriais cada vez mais falidos e subsidiados.

Quem está crescendo e ganhando é a Agricultura.

A agricultura já representa 25 % do PIB, contra 10% anos atrás.

Coloca mais serviços de advocacia, transporte, bancos e seu poder econômico passa a 30% mais ou menos.

Significa crescente poder político, que ao contrário do que a maioria das pessoas pensam, o setor Agrícola ainda não tem.

Foi sempre a agricultura que gerou exportações e superavit no câmbio, foi sempre a indústria que usou esses superavit importando máquinas estrangeiras.

A Indústria sempre foi muito mais forte politicamente do que a Agricultura, mas agora ela definha, não apresenta lucros, não tem mais poder financeiro.

Foi sempre a Indústria que indicava os Ministros da Fazenda, normalmente economistas ligados a Fiesp como Delfim Netto e Dilson Funaro, por exemplo.

Foi esse total descaso pela nossa Agricultura que resultou no enorme êxodo rural, que tanto empobreceu o país e fortaleceu justamente partidos que atendiam as demandas dos bairros pobres.

Nada menos que 45% de nossa população teve que abandonar a agricultura, abandonada que foi pelos Ministros da Fazenda.

Que nem sabem mais o significado de “Fazenda”, apropriado para um país destinado à agricultura, como o Brasil e a Argentina.

Foi Raul Prebisch, que convenceu economistas argentinos e brasileiros como Delfim, Celso Furtado, José Serra, FHC e toda a Unicamp, a esquecer nossa agricultura a favor da “industrialização” para o mercado interno, a famosa “substituição das importações”.

Por isso investir fortunas em “incentivos”, leis Kandir, subsídios via o BNDES em indústrias antigas, mas que “substituiriam as nossas importações”, importações que geralmente eram dos mais ricos, produzir produtos populares para classe C e D, nem pensar.

Somente a partir de 1994 é que passaram a produzir para a Classe C e D, movimento do qual fiz parte.

Além das milícias que invadiam terras, a luta por reservas, contra a ampliação de terras produtivas, destruição de pesquisas de aprimoramento genético.

Nossos industriais perceberam tardiamente que foi justamente essa “substituição das importações” que iria gerar nossa estagnação e não inovação, e lentamente destruímos a nossa indústria nascente a partir de 1987.

De 27% do PIB, a indústria entrou numa espiral descendente para 11% hoje.

Os advogados contratados são na maioria de recuperação financeira. Que reviravolta!

Essa atual crise política no fundo é a crise da indústria e das famílias ricas desesperadas, empobrecidas, mas ainda com certo poder político.

É a crise dos sindicatos trabalhistas que viviam dessas contribuições sindicais.

Perdem poder econômico e percebem que estão perdendo o político, do qual nunca mais se recuperarão a curto prazo.

Quem acha o contrário, que pense nos números.

Isso explica o desespero da imprensa, dos artistas subsidiados, dos intelectuais das grandes cidades.

Ele é violento, por ser desesperado.

Mas é simplesmente o canto da sereia desse grupo que vivia da indústria e de seus impostos.

Os números que apontei são inquestionáveis e só tendem a crescer.

A Agricultura, justamente por ter sido esquecida pelo Estado, venceu a Presidência e 15 Estados.

Ronaldo Caiado, representante eterno dos agricultores, vence em Goiás. As grandes cidades foram contra, elegendo Doria e Witzel.

“Bolsonaro é quase unanimidade no setor”, disse Bartolomeu Braz Pereira, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja).

Mais Brasil Menos Brasília, é na realidade o brado “mais campo e comunidade e menos cidades gigantes e em decadência moral”.

Bolsonaro não foi eleito pelos liberais nem pelos conservadores das grandes cidades, que hoje se sentem enganados e só falam mal dele.

Com o Covid, haverá uma fuga das grandes cidades para o campo, dos apartamentos para casas, dos escritórios para o Zoom.

E em mais quatro ou cinco anos, a Agricultura terá provavelmente o poder político que merece, elegerá quem quiser, com ou sem Bolsonaro candidato em 2022.

E todos sabemos que no Brasil “dinheiro é poder”.

“Follow the money”, como diria Sérgio Moro.

Na cidade Agronômica, Bolsonaro ganhou com 79% dos votos.

Na cidade de Sorriso teve 74% dos votos.

Na cidade Rio Fortuna teve 68% dos votos.

Em Mato Grosso do Sul teve 61% dos votos.

Vejam os mapas da fronteira agrícola e os votos dados ao Bolsonaro em 2018.

Quem elegerá os nossos Presidentes em 2022, 2026, 2030 será provavelmente a bancada agrícola, não a bancada industrial, sindical, nem a urbana.

A tese de que Bolsonaro não foi eleito, mas que foi Haddad que foi rejeitado não se sustenta numericamente.

Haddad tinha 41% de rejeição contra 40% de Bolsonaro. Ou seja, a diferença era de somente 1 ponto percentual.

Ricardo Salles é que está dando um chega para lá aos ecologistas que querem destruir nossa agricultura, e foi quem ajudou termos esse superavit colossal em 2020.

Nesse caso a agricultura demonstra que consegue colocar pessoas além do Ministério da Agricultura, dando suporte a essa tese.

Bolsonaro colocou uma engenheira agrônoma como Ministra da Agricultura, em vez de um político e advogado como Wagner Rossi, indicado por Lula e Dilma.

Será o constante crescimento do Comunitarismo da pequena cidade daqui para a frente, em detrimento das ideologias do passado que fracassaram.

É o crescimento do interior Comunitário e Solidário.

Sem dúvida, uma batalha que será violenta nos próximos anos, mas tudo indica que o Brasil agrícola será o vencedor.


A evolução tecnológica do agronegócio - Xico Graziano

Xico Graziano demonstra como o agronegócio não é só moderno, mas indispensável igualmente. 

Xico Graziano destaca evolução tecnológica do agronegócioa Brasil

XICO GRAZIANO
Poder360, 25.set.2020 (sexta-feira) - 6h00


Todos os municípios líderes de polos agrícolas no Brasil têm IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) acima da média dos Estados onde se localizam. Vejam algumas referências:

  1. Rondonópolis tem IDH de 0,755 e Sinop tem IDH de 0,754, contra 0,725 do Mato Grosso.
  2. Balsas tem IDH de 0,687, contra 0,639 do Maranhão.
  3. Luiz Eduardo Magalhães tem IDH de 0,716, contra 0,660 da Bahia.
  4. Rio Verde tem IDH da 0,754, contra 0,735 de Goiás.
  5. Dourados tem IDH de 0,747, contra 0,729 do Mato Grosso do Sul.
  6. Araçatuba tem IDH de 0,788, contra 0,783 do Estado de São Paulo.

O IDH superior dos municípios líderes do agronegócio comprova que o efeito multiplicador das atividades geradas no agro beneficia toda a sociedade. A renda agregada se distribui, os empregos indiretos crescem, o comércio se dinamiza. Basta ver o ânimo dos shoppings centers, das revendas de veículos, das oficinas, escritórios, dos inúmeros serviços associados ao mundo rural.

Esse dinamismo econômico provocado pelos modernos polos de agronegócio não é ainda bem entendido pela economia clássica. Nesta, divide-se a economia de um país em 3 setores: primário (agricultura), secundário (indústria) e terciário (comércio). Tal esquematização servia, antigamente, para analisar as economias onde a agricultura era tradicional, a indústria puxava e os serviços começavam.

Acontece que, no Brasil, desde os anos de 1980, as cadeias produtivas ligadas ao agro foram se tornando mais e mais complexas, envolvendo outros setores, de processamento, de insumos e máquinas, de crédito, de tecnologia, chegando até o consumo da população com marcas nas gôndolas do supermercado.

Esse movimento contemporâneo que gerou o atual agronegócio agrega muito valor aos produtos finais. Quando uma tonelada de soja, ou de carne, sai para a distribuição interna, ou é exportada pelo porto, nela está contida elevada dose de tecnologia. Poderosos investimentos em conhecimento foram capazes de elevar a produtividade dos fatores de produção rural, na média dos últimos 40 anos, em cerca de 3,4% ao ano.

Ou seja, não vivemos mais no mundo separado entre indústria e agricultura, e nem esta é mais, como se dizia, primária. Segundo o Cepea/Esalq/USP, o PIB do agronegócio sobre o PIB brasileiro cravou 21,4% em 2019. Esta é a fatia da riqueza brasileira gerada a partir da produção rural.

Nesta fatia, a produção rural, propriamente dita, representa apenas 22% do valor total do agronegócio. Ou seja, lavouras e pecuária, atividades que se praticam dentro da porteira das fazendas, já é parte menor do agronegócio. Incrível.

A agroindústria de processamento (frigoríficos, lacticínios, usinas de açúcar, celulose, torrefação de café) gera valor maior, de 30%, dentro do agronegócio como um todo. Já os chamados agrosserviços (assistência técnica, transporte de cargas, varejo, açougues, quitandas, restaurantes, finanças, propaganda, exportação, etc.), lideram o PIB do agronegócio com peso de 42%.

Resumindo: a produção da roça, hoje em dia, faz movimentar uma roda gigantesca de atividades econômicas, gerando renda e empregos que se espalham pelo país. No século 21, o rural dinamiza o urbano.

Certos economistas tradicionais ainda pensam a agricultura como antigamente. Este é o erro, grave, cometido por Luis Piemonte, em seu artigo publicado aqui no Poder360, intitulado “País focado no agronegócio será sempre desigual”.

Piemonte pensa que ainda praticamos… “a milenar agricultura, aprendida nos primórdios da humanidade (cujo) caminho normal é confiar apenas na ajuda da mãe terra, jogando nela sementes e esperando que se desenvolvam para colher, ensacar e vender”.

Meu Deus, será que o professor nunca leu nada sobre a evolução tecnológica recente do agro? Já ouviu falar na Embrapa? Em que mundo vive Luis Piemonte?

O Brasil ainda não descobriu a força de seu agro, pois se apega ao raciocínio econômico tradicional e vê apenas rasas commodities onde existe profundo valor agregado. Invertendo o raciocínio de Piemonte, eu diria: o grão de soja agrega tecnologia a cada safra, tal qual o telefone celular agrega funcionalidades ano a ano.

Em termos globais, a Austrália e a Nova Zelândia, países fortemente agrícolas, mostram elevado IDH, ocupando respectivamente o 6º e o 14º lugar no ranking mundial de qualidade de vida.

Conclusão: não é verdade que um “país focado no agronegócio será sempre desigual”. Cqd.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Agronegócio e meio ambiente: uma interação incontornável - Marcos Sawaya Jank

O diálogo necessário entre agricultura e meio ambiente 

Marcos S. Jank (*)

Jornal “O Estado de S. Paulo”, Opinião, 28/02/2020.


Em vez do ‘nós contra eles’, é preciso compatibilizar as agendas globais do clima e da alimentação.

Os dois setores da economia brasileira com maior visibilidade global são a agricultura e o meio ambiente.

O protagonismo da agricultura brasileira se dá no comércio global de commodities agropecuárias. Nossa oferta agrícola é concentrada em produtos (cerca de uma dezena), mas diversificada em destinos, atingindo mais de 200 países e cumprindo papel crucial na segurança alimentar do planeta. Porém, fora do universo da oferta agrícola, pouca gente conhece o agro brasileiro e, no geral, o vê com desconfiança.

Já o meio ambiente brasileiro tem ampla visibilidade no mundo, principalmente por conta das preocupações com biomas sensíveis como a Amazônia e o Pantanal. Aqui o Brasil é reconhecido como potência ambiental, mas atacado pela elevada quantidade de queimadas e desmatamentos – e seu impacto na mudança do clima –, além de invasões de terras indígenas e devolutas, do crescimento de monoculturas como soja e outros supostos males.

Enquanto a opinião global sobre o agro brasileiro é restrita e localizada, no caso do meio ambiente ela é ampla e generalizada. Sabemos que boa parte das críticas negativas tem mais que ver com “percepções” do que com “fatos”, a exemplo do cenário apocalíptico que foi disseminado após as queimadas do ano passado. Mas é fato que o assunto tomou conta da opinião pública internacional e hoje está solidamente presente nos organismos multilaterais, no discurso de governos e no curriculum das escolas de ensino fundamental e médio de todo o mundo.

Nos últimos tempos o tema ambiental também entrou de vez na agenda das grandes empresas e do sistema financeiro internacional, como vimos na última reunião do Fórum Econômico Mundial, em Davos. E o Brasil perdeu protagonismo na agenda da sustentabilidade, após décadas de avanços importantes na redução do desmatamento, de compromissos com o clima e de diversificação para energias renováveis.

Infelizmente, o que temos realmente visto no nosso mundo hiperconectado é um debate de surdos do tipo “nós contra eles”, decorrente de hoje participarmos de redes sociais formadas por pessoas que basicamente pensam como a gente. Nesse sentido me parece um equívoco insistir no autoelogio para plateias limitadas e catequizadas. Ou, ainda, insistir em afirmações do tipo “somos os mais sustentáveis do mundo”, mesmo que isso fosse verdade. Eu prefiro o caminho de assumir nossos avanços e os nossos problemas com mais modéstia, encarando, sem subterfúgios, o diálogo com quem pensa de forma diferente, principalmente no exterior.

Aliás, pensar diferente não deveria ser um problema. Empresas que atuam junto aos produtores entendem melhor a realidade agrícola do que as que atuam na ponta do consumidor. No universo heterogêneo das ONGs, há várias delas que trabalham há anos com produtores rurais brasileiros e têm feito defesas impecáveis da sustentabilidade da nossa agricultura no exterior. Governos europeus criticam o Brasil nessa área muito mais do que governos asiáticos, mas são estes últimos que respondem por dois terços do que exportamos hoje e com quem mais temos de dialogar.

Em suma, o Brasil não deveria tomar posição contra o restante do mundo no tema ambiental. Ao contrário, é preciso formar alianças estratégicas em diversos níveis, reconhecer os problemas existentes, enfrentar as perguntas difíceis, ampliar o diálogo e receber elogios dos outros, e não próprios.

Ao mesmo tempo, o setor privado do agro brasileiro precisa abraçar o combate ao desmatamento ilegal no Brasil, atacando a necessidade de regularização fundiária com critérios sólidos, condição básica para a punição dos abusos.

Na agenda internacional, o Brasil deveria liderar um esforço global para discutir como alimentar quase 10 bilhões de pessoas em 2050, metade delas vivendo na África e no subcontinente indiano. O modelo agrícola atual desses países claramente não permite solucionar o seu gap potencial entre oferta e demanda agrícola.

A melhor solução de longo prazo para mitigar as mudanças do clima é o menor uso de recursos naturais, que em última instância se traduz por aumento da produtividade. Os ambientalistas afirmam que o agro não enxerga que o desmatamento vai prejudicar a própria agricultura no longo prazo. Os agricultores dizem que os ambientalistas não entendem que o Brasil é um dos únicos lugares do mundo capazes de produzir duas a três safras por ano e que o mundo precisará do nosso modelo produtivo tropical para se alimentar. Ambos estão corretos, mas faltam confiança e cooperação.

Hoje sobram observatórios do clima e do uso da terra no mundo. Mas faltam observatórios da agricultura, que tragam respostas concretas para o gap potencial entre oferta e demanda de alimentos no longo prazo. Essa é uma questão que certamente envolve a agenda do clima, mas também envolve demografia, renda per capita, urbanização, modelos de produção e organização de cadeias de suprimentos. Envolve, portanto, o conceito de sustentabilidade nos seus pilares econômico, ambiental e social. Se houvesse maior diálogo entre esses observatórios, com certeza diminuiríamos a intolerância e a surdez que imperam no nosso mundo hiperconectado.