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segunda-feira, 22 de abril de 2024

STF: Como Chegamos Até Aqui? - Livro de Duda Teixeira, resenha por Diogo Schelp (Estadão)

 Análise

Novo livro sobre o STF expõe riscos do poder crescente e caráter elitista da Corte

STF: Como Chegamos Até Aqui?, de Duda Teixeira, conta a história de como o tribunal passou a ocupar espaço político no País; leia análise do livro feita pelo colunista do Estadão 

 

Por Diogo Schelp 

O Estado de S. Paulo, 22/04/2024 


Um estrangeiro desavisado que chegar ao Brasil hoje e se dispuser a observar o debate público ficará surpreso ao perceber que a figura mais falada da arena política — e a mais temida — é um juiz da corte máxima do País. Pensará, também, que a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) é um problema apenas para quem adora espalhar fake news nas redes sociais, torceu para que as Forças Armadas dessem um golpe entre novembro de 2022 e janeiro de 2023 ou se atiraria de um precipício caso o ex-presidente Jair Bolsonaro ordenasse.

Ao se fiar apenas no retrato do momento, as percepções desse estrangeiro estariam completamente equivocadas. As polêmicas que envolvem o STF e especificamente o ministro Alexandre de Moraes não afetam apenas a direita bolsonarista e nem vão se encerrar quando o bilionário Elon Musk resolver procurar outros alvos para suas postagens.

O pior é que uma boa parcela dos brasileiros sofre do mesmo equívoco do tal estrangeiro fictício, presa que está no retrato do momento da disputa entre parlamentares de oposição e STF ou dos xingamentos de bolsonaristas a ministros da corte nas redes sociais. É preciso olhar para o passado recente e entender como chegamos até aqui. Ao fazê-lo, descobrimos que o poder individual e coletivo dos onze integrantes do STF cresce gradualmente há anos, em perfeita desarmonia com o Legislativo e o Executivo, e que isso, a depender das circunstâncias, afeta todo o espectro político — além de contribuir para perpetuar um dos aspectos da desigualdade social no País, o do acesso à Justiça.

Eis o que demonstra, com muito didatismo, o livro STF: Como Chegamos Até Aqui? (Avis Rara; 128 páginas; R$ 39,90), do jornalista Duda Teixeira, que chega esta semana às livrarias. Não se trata de uma obra com histórias de bastidores da nossa Corte Suprema, mas de um livro-reportagem que recorre a documentos históricos e a entrevistas com juízes, desembargadores, advogados e acadêmicos, entre historiadores e antropólogos, para entender o que levou à hipertrofia do tribunal constitucional, como isso impacta na política e na vida nacional e o que ainda pode ser feito a respeito.

O STF nasceu em 1890, inspirado na Suprema Corte americana, para guardar e aplicar a Constituição, intervindo apenas “em espécie e por provocação de parte”. Ou seja, nada dessa história de abrir investigações, iniciar processos, proibir a circulação de informações ou mandar prender gente por conta própria como vemos atualmente. No que se refere às regras para que os Três Poderes pudessem impor freios uns aos outros de forma equilibrada, as coisas por aqui não saíram tão bem quanto nos Estados Unidos. No período em que os americanos tiveram uma constituição, os brasileiros tiveram sete.

Ao longo da história da nossa República, o STF teve momentos melhores e outros piores, como durante a última ditadura, quando a composição do tribunal foi alterado ao gosto dos militares por meio da mudança no número de ministros e da cassação de alguns integrantes. Mas foi a Constituição de 1988 que lançou as sementes para que a corte fosse adquirindo um protagonismo e um poder crescentes ao longo das décadas seguintes. Para começar, “a Carta ampliou a quantidade de instituições que podem perguntar ao STF se uma lei é ou não constitucional”, escreve Teixeira. Antes, só a Procuradoria-Geral da República podia fazer isso. Atualmente, qualquer partido nanico consegue inundar o STF com questionamentos, como de fato acontece.

Além disso, há centenas de políticos e autoridades que só podem ser julgados pelo STF quando acusados de algum crime — é o famoso foro privilegiado. Os ministros do STF também precisam decidir sobre pedidos de habeas corpus e representam a quarta (!) e última instância judicial do País, caso haja alguma questão constitucional envolvida em processos que chegam de todo o Judiciário.

Pouco a pouco, a corte foi adquirindo a tradição de assumir papeis que cabem ao Legislativo e ao Executivo sob a desculpa de decidir a constitucionalidade de leis e políticas públicas. Isso começou a ocorrer com mais frequência já no governo de Fernando Henrique Cardoso, ganhou força nos primeiros mandatos de Lula e saiu do controle a partir da gestão de Jair Bolsonaro, que por não conseguir lidar com o Congresso deixava que tudo fosse judicializado.

O livro é rico em exemplos dos avanços do STF sobre atribuições do governo ou do Parlamento. Analisados em conjunto e em uma perspectiva cronológica, permitem compreender como a corte ganhou musculatura. Tem para todos os gostos. Há, por exemplo, o julgamento sobre pesquisas com células-tronco, em 2008, em que o STF passou por cima de uma lei discutida e aprovada no Parlamento, enquanto um dos ministros tentou tipificar um novo crime em cima de suas próprias suposições morais e filosóficas e outro aproveitou a oportunidade para expandir as situações em que o aborto é permitido. Mais recentemente, há a discussão atual em torno da Lei Antidrogas, com os integrantes da corte se dispondo a definir detalhes como a quantidade de maconha que separa um usuário de um traficante.

Decisões contraditórias da corte, às vezes com intervalos curtos de tempo e com idas e vindas de um mesmo ministro, são citadas em bom número no livro. Assim, o STF muda o entendimento sobre como deve ser um processo de impeachment de um presidente (Fernando Collor e Dilma Rousseff não tiveram o mesmo tratamento), da mesma forma que é capaz de aplicar com maior ou menor liberalidade uma mesma regra constitucional, a de que parlamentares só podem ser presos em flagrante de crime inafiançável, a depender das circunstâncias políticas.

Teixeira argumenta que, pela Constituição, o senador petista Delcídio Amaral não poderia ter sido preso em 2015, nem o deputado bolsonarista Daniel Silveira, em 2021. Em ambos os casos, ministros do STF fizeram um contorcionismo interpretativo para considerar que os crimes eram permanentes, permitindo a prisão “em flagrante” dos políticos.

Em outro exemplo, um entendimento da Corte que serviu para afastar do cargo o deputado Eduardo Cunha, em 2016, não valeu depois para os senadores Renan Calheiros e Aécio Neves. E praticamente a mesma composição do STF, com um intervalo de poucos anos, suspendeu a nomeação de Lula como ministro de Dilma, de Cristiane Brasil para o Ministério do Trabalho de Michel Temer e de Alexandre Ramagem como diretor da Polícia Federal sob Bolsonaro, em três episódios de interferência indevida e injustificável em prerrogativas do presidente da República.

Fica claro no livro que os ministros do STF se permitem tomar decisões disparatadas como essas — julgando não com base no Direito, mas em interesses pessoais ou políticos — por uma variedade de razões. Entre elas está o fato de que a Corte cria as próprias regras sobre como proceder em determinadas situações. Em 2023, por exemplo, o tribunal anulou trecho do Código de Processo Civil que impedia juízes de atuar em casos a cargo de bancas de advocacia de parentes (os escritórios das esposas de quatro ministros têm processos na Corte, alguns envolvendo disputas bilionárias).

A outra é que, por não haver nenhuma instância acima do STF, seus integrantes dão de ombros para regras da magistratura, para prazos e para procedimentos sem precisar temer qualquer sanção. É o que permite que eles abram processos de ofício e distribuam para o relator que quiserem, sem obedecer à norma do sorteio, como fez o ministro Dias Toffoli com o inquérito das fake news, também chamado de inquérito do fim do mundo.

Também se sobressaem o fator vaidade e a questão do vínculos políticos. No Brasil, ao contrário dos Estados Unidos, muitos ministros do STF falam fora dos autos em entrevistas, palestras e aulas e apreciam os holofotes dos julgamentos televisionados. Ao mesmo tempo, não se privam da companhia de figuras influentes da política nacional ou de empresários em festas ou viagens particulares — mesmo que essas pessoas enfrentem processos no próprio STF.

O autor aborda também o acesso privilegiado de certos advogados a ministros do Supremo, prática conhecida jocosamente como “embargos auriculares”. Ou seja, a imparcialidade dos integrantes da nossa mais alta Corte é colocada em dúvida, com boas razões, com frequência. E eles não parecem se incomodar muito com isso. Desde que, claro, ninguém diga nada.

Críticas diretas a ministros do STF são muito mal recebidas. Alguns deles tratam de processar os autores das opiniões negativas na primeira instância da Justiça, contando com a alta probabilidade de que os juízes pensarão duas vezes antes de tomar uma decisão que vá contra aquele que está no topo da magistratura.

Outros partem para algo mais rápido e efetivo: a censura. Foi uma reportagem sobre Dias Toffoli na revista Crusoé, da qual Teixeira é editor, o que motivou, no início, o interminável inquérito das fake news. E foram críticas diretas a Alexandre de Moraes que o levaram, em alguns dos casos que agora vêm à tona com mais detalhes, a ordenar a suspensão de perfis ou conteúdos das redes sociais.

Essa postura dos ministros do STF, que deveriam entender que receber críticas faz parte da descrição do cargo, é comparada por Teixeira ao crime contra a “pessoa do rei ou seu Estado real”, previsto nas Ordenações Filipinas, conjunto de leis da coroa portuguesa que vigorou entre os séculos XVII e XIX. Dizia seu livro quinto, título VI, que o “lesa-majestade (...) é um crime tão grave e abominável, que os antigos sabedores o estranharam e o comparavam à lepra”.

A Suprema Corte brasileira que emerge do livro STF — Como chegamos até aqui é implacável com os pobres, como mostram exemplos de penas duras que foram mantidas para ladrões de galinhas, de bermudas ou de macacos automotivos, e garantista com poderosos, a ponto, escreve o autor, de reverter entendimento anterior sobre a possibilidade de prisão em segunda instância para favorecer Lula, em 2019, “fulanizando” a jurisprudência. Compreender e reconhecer seus excessos interessa a todos os brasileiros, independente de posicionamento político. E, apesar dos ecos das Ordenações Filipinas, criticar abertamente sua atuação ainda é a melhor forma de pressionar seus integrantes a conter o próprio poder.

Análise por Diogo Schelp 

Jornalista e comentarista político, foi editor executivo da Veja entre 2012 e 2018. Posteriormente, foi redator-chefe da Istoé, colunista de política do UOL e comentarista da Jovem Pan News. É mestre em Relações Internacionais pela USP.

 

 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Interferência do STF na Economia - Embaixador Sergio Florêncio

 Notícia original:


Comentários embaixador Sergio Florêncio:

“ O STF que há muito vem, na política, exorbitando o papel de legislador e executivo o que deu margem para o Bolsonaro justificar seus lampejos ditatoriais, agora resolveu interferir diretamente na economia.

O povo nunca lhe deu um voto para exercer esse papel.

O Supremo cometeu excessos, sem dúvida, o que era inevitável num sistema político que dá poderes monopolista e  injustificáveis ao  Presidente da Câmara. Isso  impediu avançar o impeachment de um PR com inúmeros crimes de responsabilidade, prevaricação e outros. 

Isso e outras indefinições do legislativo obrigou o judiciário/STF a decisões fora de suas atribuições.  Mas, diante das ameaças gravíssimas à democracia, ao Estado de Direito e ao sistema eleitoral , o STF e o TSE tiveram papel exemplar. Como bem demonstra  Mounk em seu livro  O Povo contra a Democracia, os regimes autocráticos começam deslegitimando o Judiciário. O Brasil escapou  desse trágico destino. O STF foi a peça chave da resistência.“



quinta-feira, 23 de junho de 2022

ADB busca ex-ministros do STF para entrar com ADIN contra PEC 34 - Guilherme Waltenberg (Poder 360)

ADB busca ex-ministros do STF para entrar com ADIN contra PEC 34 

GUILHERME WALTENBERG 
Poder 360, 23.jun.2022

Diplomatas dizem que proposta que permite a políticos assumirem embaixadas sem a perda de mandato fragiliza separação dos poderes

A PEC 34, que permite a políticos serem embaixadores sem a perda de mandato está avançando no Senado com o patrocínio do expresidente da Casa Davi Alcolumbre (UB-AP). Foi marcada para o próximo dia 5 de julho a 1ª audiência sobre o tema. E os diplomatas já estão mobilizados para barrarem a proposta.

Atualmente, caso queiram assumir uma embaixada, políticos precisam necessariamente abandonar o cargo para o qual foram eleitos. Se as novas regras forem aprovadas, poderão ir para outro país e, ao retornar ao Brasil, terem os seus cargos de volta.

A presidente da ADB (Associação dos Diplomatas Brasileiros), embaixadora Maria Celina de Azevedo Rodrigues diz que a entidade já está em contato com ex-ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) para terem pareceres mostrando o que chama de inconstitucionalidade do projeto.

“Estamos preparando uma ADI [Ação Direta de Inconstitucionalidade] contra essa proposta. Ela fere a separação dos poderes“ , disse ao Poder360.

Ao lado de outros diplomatas, Maria Celina elencou 4 pontos que eles consideram preocupantes da PEC. São eles:

-Fere a separação de poderes;
-Cargo de embaixador pode virar objeto de
-barganha política;
-Municipalização da política externa;
-Falta de formação adequada para o cargo.

Alcolumbre é presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e, desde a escolha do ex-senador Antonio Anastasia para o cargo de ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) ele tem articulado a proposta.

Inicialmente, a ideia é que ela servisse de prêmio de consolação para os senadores que não foram escolhidos. Inicialmente, porém, a proposta não empolgou. Agora, com outros assuntos como a crise de preços da Petrobras e a prisão do ex-ministro Milton Ribeiro, a ideia é tentar avançar no tema sem que esse andamento ganhe visibilidade.

BARGANHA
Para Maria Celina, a formação e a rede de contatos construída ao longo da carreira por diplomatas profissionais são diferenciais para que o país atinja os seus objetivos em política externa.

“A natureza do Senado é justamente a de representar os seus Estados. Já a política externa, aquilo que favorece ao país, muitas vezes pode parecer ruim para um Estado ou alguns municípios. Nem por isso deve-se abandonar ideias que favoreçam o país“ ,afirma.

https://www.poder360.com.br/brasil/adb-busca-ex-ministros-do-stf-para-entrar-com-adin-contra-pec-34/

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

A quadrilha dos malfeitores do PT - IstoÉ (setembro de 2017)

 Brasil

A quadrilha dos malfeitores do PT

Em menos de 24 horas, a cúpula do PT foi denunciada pelo Ministério Público em dois processos. No primeiro, Lula, Dilma e outros 6 petistas são acusados de receber R$ 1,5 bilhão em propinas.

No segundo, os dois ex-presidentes são suspeitos de obstrução de Justiça.

 

A quadrilha dos malfeitores do PT

Paulo Bernardo, Vaccari, Dilma, Palocci, Lula, Gleisi, Mantega e Edinho

Tábata Viapiana

IstoÉn. 2491, 07/09/2017 - 17h00

 

Disponível: https://www.academia.edu/70776548/A_quadrilha_dos_malfeitores_do_PT_ISTOÉ_Independente_2017_

 

Nunca, na história deste País, se roubou tanto como nos governos petistas de Lula e Dilma. De 2003 a 2016, a quadrilha do PT, que teve Lula como “o grande idealizador”, recebeu R$ 1,485 bilhão em propinas. Desse valor, somente o ex-presidente Lula embolsou R$ 230,8 milhões das construtoras OAS e Odebrecht, como contrapartida por ter ajudado os negócios das empreiteiras em obras da Petrobras. Esse é o resumo da denúncia feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última quarta-feira 6, e que enquadrou os dois ex-presidentes nos crimes de organização criminosa, como resultado do inquérito chamado de “quadrilhão do PT”. Foram denunciados também a senadora e presidente do PT Gleisi Hoffmann, o marido dela, o ex-ministro Paulo Bernardo, o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, e mais três ex-ministros: Antônio Palocci, Guido Mantega e Edinho Silva. As penas aos petistas podem ir de três a oito anos de cadeia. Por ser chefe da quadrilha, como disse Janot, Lula deverá ser condenado a uma pena ainda maior.

 

O desfalque na Petrobras

Em 209 páginas de sua denúncia, o procurador Rodrigo Janot mostra que a alta cúpula do PT se estruturou para assaltar os cofres públicos, especialmente da Petrobras, mas também do BNDES e do Ministério do Planejamento. Somente à Petrobras, o esquema petista provocou um prejuízo de R$ 29 bilhões. Para ressarcir parte desses danos, o procurador pede que o STF faça o bloqueio de R$ 6,5 bilhões dos bens dos oito denunciados. Esta é a sétima denúncia contra Lula. Janot diz que o ex-presidente continuou recebendo propina inclusive depois que deixou a presidência. Se o STF aceitar a denúncia, Dilma pode se sentar no banco dos réus pela primeira vez na Lava Jato.

O “quadrilhão” petista tem um peso enorme em esquemas ilícitos por envolver dois ex-presidentes, que tinham pleno conhecimento de todas as falcatruas em seus governos, segundo o MPF. Somente as empresas do grupo Odebrecht, por exemplo, de 2002 a 2014, pagaram a título de propina mais de R$ 400 milhões ao PT. As relações espúrias do partido com empresas privadas também envolviam OAS, Andrade Gutierrez, UTC e JBS. Durante o primeiro mandato, de acordo com Janot, Lula articulou a compra de apoio político de parlamentares com uso de dinheiro público: o PP levou R$ 390 milhões, o PMDB do Senado pelo menos R$ 600 milhões e o PMDB da Câmara outros R$ 350 milhões.

 

Durante seu governo, Dilma deu seguimento a todas as tratativas ilícitas iniciadas por Lula. Em muitos casos, a ex-presidente atuou de forma indireta por intermédio dos então ministros Guido Mantega e Edinho Silva, na cobrança de valores ilícitos junto a empresários. O caso está nas mãos do ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato em função do envolvimento da senadora Gleisi Hoffmann, que tem foro privilegiado.

Num recorde de Janot, que deixa o cargo no próximo dia 17, a Procuradoria-Geral da República fez nova denúncia contra Lula, Dilma e o ex-ministro Aloizio Mercadante na tarde de quarta-feira 6, desta vez por obstrução de Justiça. Lula e Dilma são investigados desde agosto de 2016, com base no vazamento de uma gravação feita pela PF nos telefones do ex-presidente. No diálogo entre os dois, em março do ano passado, Dilma diz a Lula que está enviando um emissário, “o Bessias” (na verdade ele chama-se Jorge Messias), com um termo de posse do petista como ministro da Casa Civil para qualquer emergência. Lula responde que está aguardando o documento e despede-se dizendo “tchau querida”. O Ministério Público entendeu que a nomeação açodada objetivava conceder foro privilegiado a Lula, impedindo eventual pedido de prisão contra ele. Já o ex-ministro Mercadante é acusado de tentar impedir a delação premiada do ex-senador Delcídio do Amaral.

 

Dr. Honoris Causa em corrupção

As investigações mostram que o ex-presidente Lula é expert em desvios de dinheiro público

- A Procuradoria-geral da República acusa o ex-presidente de ser o “grande idealizador” da organização criminosa formada no governo federal para desviar recursos da Petrobras. De 2002 a 2016, a quadrilha de Lula recebeu R$ 1,48 bilhão em propina.

- Entre os 128,1 milhões que Lula recebeu da Odebrecht, estão R$ 12,4 milhões gastos na compra de um terreno para o Instituto Lula e R$ 504 mil na aquisição de uma cobertura ao lado da sua em São Bernardo.

- Dos R$ 27 milhões que o ex-presidente recebeu da OAS, estão contabilizados o tríplex que ele ganhou no Guarujá. Por causa desse imóvel, Lula foi condenado a uma pena de nove anos e seis meses de prisão.

- Lula é réu ainda em outros cinco processos, a maioria por corrupção. Na última denúncia, ele é acusado de receber R$ 1,02 milhão da OAS e Odebrecht para a reforma do sítio de Atibaia.

 

 

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

As estranhas reações à indicação de André Mendonça para o STF - Vladimir Passos de Freitas (Conjur)

 Defendendo a reputação do "acusado": 

Segunda Leitura

As estranhas reações à indicação de André Mendonça para o STF

Por 

https://www.conjur.com.br/2021-dez-26/segunda-leitura-estranhas-reacoes-indicacao-andre-mendonca-stf

O presidente da República, em 13 de julho deste ano, indicou André Luiz de Almeida Mendonça para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, conforme determina o artigo 84, inciso XIV, da Constituição Federal. Para fazê-lo, seguiu as exigências do artigo 101, que exige dos integrantes da Corte mais de 35 e menos de 65 anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada.

O indicado tem 48 anos de idade, portanto, dentro dos limites constitucionais. Seu saber jurídico é notável, bastando lembrar, entre outras coisas, que é doutor e mestre em Direito pela Universidade de Salamanca, Espanha, foi pesquisador e professor visitante da Universidade de Stetson, Estados Unidos, é professor do curso LL.M em Direito: Compliance, da FGV-Rio, do programa de mestrado e doutorado em Direito da Instituição Toledo de Ensino de Bauru e do Programa de Pós-Graduação "stricto sensu" do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social-Cedes, em São Paulo. Finalmente, é detentor de reputação ilibada, pois, na sabatina a que se submeteu no Senado, não se disse uma só palavra que pudesse desaboná-lo.

Portanto, cumprindo todos os requisitos constitucionais, era de se esperar que sua indicação transcorresse sem grandes sobressaltos. No entanto, o que aconteceu foi o oposto. Somente em 1º de dezembro ele foi inquirido e aprovado no Senado, tendo que aguardar quatro meses em espera plena de ameaças de rejeição.

Mas então, se preenchia André Mendonça, com facilidade, os requisitos constitucionais, qual a razão de sua tormentosa espera? Ser pastor evangélico da Igreja Presbiteriana do Brasil. 

Segundo consta, "A Igreja Presbiteriana do Brasil é uma federação de igrejas que têm em comum uma história, uma forma de governo, uma teologia, bem como um padrão de culto e de vida comunitária. Historicamente, a IPB pertence à família das igrejas reformadas ao redor do mundo, tendo surgido no Brasil em 1859, como fruto do trabalho missionário da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos" [1]. Ela foi trazida ao Brasil por Ashbel Green Simonton, na cidade do Rio de Janeiro, em 1859. 

Totalmente entranhada na vida nacional (p. ex., o Instituto Presbiteriano Mackenzie), a IPB desenvolve diversas atividades. Seus pastores, tal qual os padres da Igreja Católica Apostólica Romana, têm por missão auxiliar as pessoas a conduzir-se de acordo com os ensinamentos da Bíblia.

Mas, afinal, o que isto significa de tão perigoso, de modo a despertar temor tão grave? 

A resposta é uma mescla de ideias e sentimentos paralelos, envolvidos por disputas políticas, onde a paixão irracional dá o tom do raciocínio. Neste caldeirão entram desde uma frase dita pelo chefe do Executivo, no sentido de que escolheria um ministro "terrivelmente evangélico", até ocorrências com Igrejas pentecostais sem qualquer tradição, fundadas aleatoriamente com objetivos pouco claros.

No centro da rejeição ao nome de André Mendonça estaria um temor de que os seus julgamentos viessem a ser feitos com fundamento na Bíblia e não na Constituição do Brasil. Em outras palavras, da formação de um Estado Teocrático, como, na atualidade, alguns no Oriente Médio. Implícito a tal suposição, vinha um receio de medidas contrárias às conquistas sociais mais recentes, o que representaria um retrocesso, todas tomadas com fiel obediência ao Presidente da República que o indicou.

Há fundamento para tais suposições?

A primeira observação é a de que o indicado ser cristão significa, exclusivamente, seguir os ensinamentos de Jesus Cristo. Estes, perenizados nas palavras dos apóstolos no Novo testamento da Bíblia, nada mais são do que buscar a conversão interior, cultivar a humildade, repelir a vaidade, cultivar a solidariedade, a paz, para, a partir delas, mudar o mundo. Toda a civilização ocidental vem pautada por seus princípios e, se muitos erros foram e continuam sendo cometidos, é porque nós, seres humanos, somos imperfeitos e necessitamos perseguir permanentemente o nosso aprimoramento.

Entretanto, abstraindo o fato de ser cristão, que muito longe de ser defeito é virtude, há outros aspectos que ataques irrefletidos e carregados de conotação política não levaram em conta.

Um deles é o de que, sejam quais forem as previsões ou as promessas feitas para alguém sondado para ocupar uma vaga no STF, jamais será possível ter-se, a respeito, certeza absoluta. As razões são várias, mas entre elas está a de que as pessoas podem mudar suas posições a partir do conhecimento da realidade, do amadurecimento e da avaliação dos fatos sob um panorama nacional e não local.

Outro é a forma como se encara a suposta lealdade. Para uns, ela consiste em uma servil obediência a quem fez a indicação. Aqui há um erro de foco. Se algum ministro procedeu ou vier a proceder de tal forma, o problema será de caráter e não de "lealdade". Gratidão deve haver, por óbvio. E isto deve traduzir-se em atos de atenção e solidariedade ao longo da vida. Julgar de acordo com o desejo de quem fez a indicação é outra coisa. Isto está mais para um pacto de sangue da máfia siciliana do que para o nobre sentimento de lealdade. Grandes ministros, como Teori Zavascki (indicado pela presidente Dilma Rousseff) e Cezar Peluso (indicado pelo presidente Lula da Silva), nunca votaram pagando o "favor".

Ainda, os presidentes da República atuam por mandato. Portanto, um indicado estará mais próximo de quem indica apenas por um período que, por vezes, pode ser curto e, em outras, no máximo, dobrado por uma vez. E depois terá décadas de afastamento formal.

A partir da discreta personalidade do ministro André Mendonça, vejamos se há indicadores de que venha a agir incorretamente. E aí temos o terceiro requisito para alguém que ocupe a mais elevada posição do Judiciário brasileiro: moral ilibada. 

Do ponto de vista de antecedentes, é impossível encontrar máculas na vida do indicado. Sua vida, como pode imaginar o mais ingênuo dos brasileiros, foi vasculhada de cima a baixo pelos contrários à sua indicação. E nada foi encontrado. Se tivesse feito uma malcriação à professora do segundo ano primário na pequena Miracatu (SP), certamente isto teria vindo à tona.

O fato é que o novo ministro tem longa trajetória como membro da Advocacia-Geral da União (desde 2000), chegando à posição máxima na hierarquia, qual seja, ministro Advogado-Geral da União, sem qualquer mácula.

E mais. Em um país em que a corrupção dá mostras de forte resistência, conseguindo expressivas seguidas vitórias, traz o novo ministro larga experiência no seu combate [2]. Com efeito, foi ele assessor especial do ministro da Transparência e Controladoria-Geral da União, coordenou a negociação do acordo com o Grupo OK, relacionado ao conhecido caso da construção do TRT de SP, gerando expressiva recuperação de ativos, coordenou as equipes de negociação dos acordos de leniência celebrados pela CGU e AGU nos casos relacionados com a Operação Lava Jato e é autor do livro Negociación en casos de corrupción: fundamentos teóricos y prácticos [3]. Portanto, é um experto no assunto.

Ao final, na falta de dados concretos, sobrevieram outras acusações contra o indicado, como a de mau uso da Lei de Segurança Nacional quando à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Ora, a lei estava em vigor e usá-la era praticar ato de ofício.

Em suma, em boa hora o Senado aprovou a indicação de André Luiz de Almeida Mendonça para o cargo de ministro do STF. Supremo absurdo seria o fato de ser cristão prejudicá-lo, não sendo demais lembrar que o preâmbulo da Constituição, explicitamente, reconhece ser ela promulgada sob a proteção de Deus e o artigo 5º, inciso VI, assegura a todos a liberdade de crença. Nada melhor que o período de Natal para que isto seja lembrado.

O passado do novo integrante da Corte, sua simplicidade, habilidade conciliatória, aversão ao exibicionismo, dão a certeza de que bem cumprirá sua nobre missão. É o que o Brasil precisa.


[1] Disponível em: https://ipb.org.br/ipb/história. Acesso em 22 dez. 2021.

[2] Informações obtidas a partir de consulta feita em Busca Textual - Currículo Lattes (cnpq.br). Acesso em 23 dez. 2021.

[3] MENDONÇA, André Luiz de Almeida. Valencia: Editora Tirant lo Blanch, Espanha, 2018.

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Por que defendo a decisão da Ministra Rosa Weber? - Deputado Rodrigo Maia (O Globo)

 POR QUE DEFENDO A DECISÃO DA MINISTRA ROSA WEBER?!

Rodrigo Maia, Deputado Federal pelo Rio de Janeiro
O Globo, 09/11/2021 

A decisão da Min. Rosa Weber, que determinou a suspensão do “orçamento secreto” e a adoção de medidas de transparência, tem gerado controvérsia. Lideranças parlamentares ligadas ao governo falam em crise com o STF. A decisão, contudo, limita-se a dar fiel cumprimento a uma regra aprovada pelo próprio Congresso em reformas recentes. Não pode ser interpretada como uma interferência na autonomia do Legislativo.

A LDO de 2014 já consagrava o caráter impositivo das emendas individuais. A Emenda n. 86/2015 constitucionalizou o “princípio da execução equitativa”, reafirmado na Emenda n. 100/2019. Segundo esse princípio, o governo deve observar critérios objetivos e imparciais na execução do orçamento, e as emendas apresentadas devem ser tratadas de forma igualitária e impessoal. Portanto, o próprio Congresso aprovou (nesta Legislatura) norma que proíbe o uso das emendas como uma ferramenta de gestão de coalizão parlamentar.

Podemos discutir, no mérito, se é bom ou ruim que em um sistema presidencialista com tantos partidos o governo possa lançar mão das emendas como forma de construir sua base. Mas esse debate já ocorreu, e uma decisão clara foi tomada. Não podemos fechar os olhos: o modelo instaurado pelo “orçamento secreto” não se coaduna com a Constituição, com “critérios objetivos e imparciais”, com “tratamento igualitário” de parlamentares.

Não se trata aqui de uma crítica indiscriminada às emendas individuais ou à busca dos parlamentares por mais recursos para os estados e regiões que representam, uma luta legítima. O modelo urdido pelas lideranças governistas, contudo, pretende lançar esse jogo fora dos limites constitucionais. Se o Congresso entende que precisa ter mais peso no orçamento, deve defender abertamente isso, aumentando o volume de recursos que serão alocados diretamente por decisão legislativa. As emendas, porém, devem ser empregadas de forma objetiva, impessoal e equitativa, a menos que a Constituição seja modificada. Por que a regra que valeu para o governo do PT não pode valer para o governo Bolsonaro, que se elegeu com uma crítica contumaz ao “toma-lá-dá-cá”?

A questão da transparência é outro grande problema. Ocultar os “congressistas requerentes da despesa” produz um quadro que é pior do aquele que se tinha antes de 2014. Naqueles tempos, era possível identificar e tematizar o tratamento diferenciado conferido aos parlamentares. Sabia-se quem estava recebendo, quanto, quando e para que. Agora, nem isso. O STF não pode controlar o mérito das emendas parlamentares e das alocações orçamentárias, mas pode (e deve) fiscalizar o procedimento orçamentário. O Congresso deve satisfação para a sociedade, mas, sem transparência, não há controle político pelas urnas.

O “orçamento secreto” gera, ainda, dois efeitos colaterais. Primeiro, diante elevada rigidez orçamentária, com despesas discricionárias abaixo de 7% do total, o abuso das emendas de relator desorganiza os programas estruturais de políticas públicas ao disputar recursos com eles. Num momento em que essas políticas são centrais para a rede de proteção social e para a retomada da economia, temos que privilegiar iniciativas que pensam de forma sistêmica o País. Segundo, com a proximidade das eleições, o acesso aos recursos do “orçamento secreto” gera uma vantagem competitiva para os beneficiados. Em nosso modelo eleitoral, políticos da mesma sigla acabam competindo entre si. Por isso, a cooptação de apoio no varejo, com base nas emendas de relator e à margem da ação de lideranças partidárias, estimula o racha em partidos outrora disciplinados.

Se o STF referendar a cautelar, assegurará a observância de regra duas vezes aprovada pelo Congresso, destinada a fomentar uma política parlamentar transparente e impessoal. Ela pode ser alterada no futuro, mas enquanto estiver no texto da Constituição, ninguém pode acusar o Tribunal de invadir o espaço do Legislativo.

terça-feira, 9 de novembro de 2021

Mini-reflexões sob a forma de perguntas em torno do suicídio de uma nação - Paulo Roberto de Almeida

Mini-reflexões sob a forma de perguntas em torno do suicídio de uma nação

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

  

Ministros do STF, que “conversam” com parlamentares, tendem a apoiar uma acomodação em relação às emendas direcionadas pelo arbítrio dos “amigos” do dinheiro público. Estarão oficializando a imoralidade no processo orçamentário? Vão contribuir para um maior afundamento do Brasil?

Custo a crer que o rebaixamento oficial de qualquer critério ético e até mesmo racional na aplicação de recursos públicos se torne um padrão na administração dos negócios governamentais. 

O patrimonialismo sacramentado e garantido pelos três poderes passará a ser uma prática “normal” na gestão das contas públicas? 

Estamos assistindo à construção de um suicídio lento do que antes parecia ser uma promessa de democracia num país em desenvolvimento?

Como podem supostas elites políticas participar dessa montagem de um processo “legal”  e oficial de um estupro orçamentário permanente? 

Quando foi que o Brasil ingressou na bandalheira geral como norma de governo? A sociedade civil em geral, as elites econômicas em especial, os guardiões da constitucionalidade não estão se dando conta de que estão construindo um Estado monstruoso, um país inviável na simples organização das contas públicas?

As perguntas básicas são estas: quando foi, como foi, por que foi que o Brasil enveredou pela via do “jeitinho” imoral de decidir sobre a peça central de qualquer regime democrático, que é o orçamento público? Quem, quais foram os responsáveis pela morte de um Estado responsável?

Como é possível conviver com tais níveis de degradação moral como as que assistimos no momento do esquartejamento ritual do orçamento anual em centenas de emendas paroquiais que representam a irracionalidade suprema da aplicação das receitas dos impostos?

Os legisladores perderam definitivamente a vergonha e os órgãos de controle se eximem de suas responsabilidades? O planejamento do orçamento em projetos racionais de aplicação dos recursos arrecadados deixou de existir? 

Instalou-se o repasto das hienas como forma normal de repartição dos despojos do Estado?

Minhas perguntas são apenas o reflexo de minhas perplexidades em face do espetáculo contínuo de degradação do processo orçamentário no Brasil. As pessoas não repararam que estamos construindo um país inviável? Até quando persistiremos a ser os lemingues de mafiosos inconscientes?

Até quando continuará a derrocada institucional do Brasil? Como para os desafios climáticos, estamos legando apenas desastres orçamentários e na dívida pública para nossos filhos e netos? Eles irão se juntar aos milhões de refugiados econômicos que já transitam do Sul para o Norte do planeta? 

Os pobres já estão emigrando há muito tempo? E agora, além dos miseráveis, quadros formados, cérebros produtivos também já desistiram de conviver com a imoralidade e a desfaçatez dos políticos? Pessoas dignas já não suportam a imoralidade e a corrupção de nossos círculos dirigentes?

Os políticos estão finalmente conseguindo implantar seus desejos inconfessáveis? A canalização tranquila dos recursos da União para a miríade de esmolas particularistas com as quais vão viabilizar eternas reeleições? Estilhaçar dotações orçamentárias em milhares de emendas oportunistas é o seu projeto de nação? 

No momento, eu não tenho as respostas ao desafio que representa construir um país viável, mas já tenho muitas perguntas que, por enquanto, representam um questionamento pessoal. Não sei se os ilustres dirigentes e as elites econômicas também as têm para si. 

Este é apenas um exercício intelectual.

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4013, 9 novembro 2021, 2 p.

 

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

O STF padece de excesso de poderes, e isso não é bom: O excesso de poder do Supremo atrapalha o crescimento do país - José Jácomo Gimenes

 O Brasil perde 5%, ou mais, do PIB com a barafunda constitucional, que estrangula ou é criada pelo próprio STF.


O excesso de poder do Supremo atrapalha o crescimento do país

Somente uma reforma estrutural do sistema judicial, com uma redução drástica da competência do Supremo, poderá resolver o histórico de ineficiência, lentidão, insegurança e injustiça. Artigo do juiz federal e professor aposentado José Jácomo Gimenes, publicado pela Gazeta do Povo:


O Brasil tem um amplo controle de constitucionalidade de leis e normas. Combinou o modelo europeu, abstrato e concentrado, com o modelo americano, concreto e difuso. O controle de constitucionalidade abstrato é concentrado no Supremo Tribunal Federal, por meio de Ação Direta de Constitucionalidade (ADC), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). O controle concreto, sempre a partir de um conflito real judicializado, é feito de forma difusa, por todos os juízes de primeira instância (cerca de 18 mil) e todos os tribunais (91, sendo 61 federais e 30 estaduais), necessitando de confirmação do Supremo para ter validade nacionalmente.

Assentados estes pontos, duas perguntas essenciais pedem respostas: por que temos tanta demora processual e insegurança jurídica com um controle de constitucionalidade tão poderoso? Como se explica um estoque de 1.986 ações de constitucionalidade pendentes no Supremo, apesar do reconhecido esforço e trabalho dos 11 ministros da corte constitucional? Este modesto artigo tem por objetivo ensaiar respostas e incentivar debate responsável sobre o excesso de competência processual do Supremo e o estoque de processos esperando julgamento na nossa suprema corte. Vamos aos números.

O Supremo recebeu 90.039 processos em 2019, sendo 20.125 (22,4%) da competência originária (processos que começam no Supremo) e 69.914 (77,6%) da competência recursal (processos que vêm das instâncias inferiores). Dentro da competência originária, destacam-se a entrada de 349 novas ações de controle concentrado de constitucionalidade em 2019 e o julgamento de 271 (200 em 2018) dessa mesma espécie. Em 2019, o Supremo proferiu mais de 16,6 mil decisões colegiadas de um total de 110 mil, considerando também as decisões monocráticas e despachos. O estoque de processos na fila de julgamento do Supremo, mesmo festejado como menor, é estrondoso: 30.662 processos.

Os explosivos números acima evidenciam que há alguma coisa errada ou, no mínimo, mal estruturada. Na comparação com as demais cortes supremas das grandes democracias, os números do nosso Supremo pairam no patamar do inacreditável, da chacota. Basta lembrar dois exemplos: a Corte Suprema americana recebe por volta de 5 mil processos por ano, escolhe em média 120 para julgamento e arquiva os demais; a Corte Suprema da Alemanha produz uma média de 7 mil decisões por ano. Os espantosos números do nosso Supremo (mais de 110 mil decisões por ano, 16,6 mil colegiadas) indicam que a corte é quase juízo universal da nação: nada escapa, parecendo um insaciável resolvedor dos conflitos do país, assim perdendo o foco de sua função diretiva do sistema judicial.

Como se vê, o nosso Supremo está atolado em seus poderes processuais, muito além da capacidade de trabalho de seus 11 ministros e de sua natural função de corte constitucional. Em um país continental, com 210 milhões de habitantes, com uma Constituição extensa, regulando quase todos os aspectos da vida nacional, o Supremo não pode ter competência para decidir processos de casos subjetivos, só porque debatem questões constitucionais. O recebimento de 69 mil recursos e 20 mil ações originais em um ano é prova suficiente dessa conclusão. O caminho deve ser outro.

O Supremo recebe mais de 300 ações diretas de constitucionalidade de leis e normas por ano, processos sobre questões objetivas (controle concentrado e abstrato), trabalho (e responsabilidade) de importância fundamental e até prioritário para uma corte constitucional, pois podem resolver com rapidez questões constitucionais e evitar propagação de milhões de processos pelo país afora. Com o estoque atual de quase 2 mil ações constitucionais diretas, o Supremo levaria seis a sete anos para colocar a casa em ordem, sem contar a entrada de novas 300 ações a cada ano, que acumularia novo passivo igual ou maior no mesmo período. Só por esse ângulo já temos uma situação insustentável, que exige atitude de mudança.

O outro megaproblema dos 69 mil recursos de processos subjetivos e das 20 mil ações de competência originária tem de ser resolvido com mudança estrutural, com a transferência de poderes processuais para os importantes tribunais superiores nacionais (STJ, TST, TSE e STM) decidirem também as questões constitucionais de todos os processos subjetivos, concluindo a jurisdição dos processos subjetivos na terceira instância, acabando com o famoso Recurso Extraordinário e congêneres, que encaminham milhares de processos ao Supremo.

O necessário controle da constitucionalidade nesses milhares de casos decorrentes de conflitos reais deve ser feito por ações autônomas de constitucionalidade, similares às existentes, mas sobre a jurisprudência consolidada resultante nos tribunais superiores (normas de efeito concreto), reduzindo substancialmente o número de processos no Supremo, libertando a corte da monstruosa carga atual, impossível de ser vencida, permitindo que cumpra com eficiência e rapidez sua verdadeira e fundamental função constitucional.

As grandes democracias adotam um sistema de duas instâncias de julgamento para processos subjetivos ou, no máximo, três instâncias. O Brasil instituiu um sistema de até quatro instâncias, na jurisdição comum e até nos juizados especiais, levando ao Supremo milhares de processos subjetivos, casos particulares, especialmente na área criminal, inviabilizando a nossa suprema corte de bem cumprir a sua função essencial de corte constitucional. O excesso de instâncias e burocracia judicial é uma tragédia que está sendo escrita com a cumplicidade dos poderes constituídos, gerando malefícios para toda a sociedade.

É incompreensível manter um sistema que não funciona, que não atende razoavelmente seus objetivos de pacificação social. A sociedade tem o direito de mudar um sistema ineficiente. O Supremo tem obrigação histórica de colaborar efetivamente para esse aprimoramento, apresentando soluções e entregando poderes aos demais tribunais. Não se pode perder de vista que os poderes são concedidos pela sociedade aos órgãos estatais para atender bem sua função institucional. Se o poder está desmedido, atrapalhando o funcionamento eficiente do serviço estatal, deve ser repactuado. Além de reforma administrativa e tributária, o Brasil precisa desesperadamente de uma boa reforma judicial.

Quem ganha e quem perde com o atual sistema judicial de quatro instâncias, recheado de dezenas de recursos e ações paralelas, doentiamente dependente do Supremo em razão de sua exorbitante competência, demorado e altamente custoso (1,6% do PIB, maior índice do planeta)? Sem intenção de ofensa ou desconsideração de importantes categorias de trabalho, o quadro permite afirmar que ganham os que estão incluídos na colossal máquina judicial, numa zona de conforto protegida, com empregos garantidos, amplo espaço de poder e excelentes rendimentos. Perde a sociedade brasileira, que vê o crescimento do país atravancado por um sistema judicial altamente burocrático, caro e pouco funcional.

A doutrina jurídica tem debatido continua e sabiamente princípios, conceitos, institutos e formas possíveis de aplicação da lei. Entretanto, parece não haver a mesma preocupação com o monstruoso problema real que os números processuais e demoras decorrentes constituem. Não se pode esquecer que a legitimidade e respeitabilidade dos órgãos estatais e, por consequência, do próprio sistema judicial dependem essencialmente de procedimentos decisórios razoavelmente rápidos, eficientes e justos. Somente uma reforma estrutural do sistema judicial, com uma redução drástica da competência do Supremo, poderá resolver o histórico de ineficiência, lentidão, insegurança e injustiça, permitindo conclusão mais rápida dos processos, jurisprudência constitucional estabilizadora em tempo mais curto, segurança jurídica, pacificação social e progresso econômico.

José Jácomo Gimenes é juiz federal e professor aposentado do Departamento de Direito Privado e Processual da Universidade Estadual de Maringá.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Carta do Rap para o juiz do STF (Marco Aurelio) - Sergio Sayeg

Sergio Sayeg, 18/10/2020

CARTA DO RAP PARA O JUIZ DO STF

 

Tudo beleza, Marco Aurélio? Véi, que zebrada tu armô, aliviando pro tal do sujeito do “rap”! Tá de sacanagem, mermão?

Sem essa de dizer que tu tava só aplicando a lei. Não tenho muita ciência desses barato, mas, pelo que saquei, as decisão nessa área são meio incerta. Escutei que um parceiro teu se baseou nessa mesma lei pra manter o bonitinho no xilindró. Chego à conclusão de que a lei se aplica nos conforme do gosto do freguês. 

Na minha humilde opinião, o que tá cravado no código devia ser filtrado pelo cobrão que vai definir a pena do ripado e examinar as particularidade do caso pra tomar uma decisão batuta. 

Se assim não fosse, a gente podia destituir os capa-preta folgado que nem tu. Bastava pegar um escriturário mané que verificasse que artigo o óme se enquadrava e carimbava no prontuário: “inocente”. Não precisava gastar toda essa dinheirama com juiz que surfa no jabá e ostenta vida de nababo, auxílio-rango, mordomia, o escambau.  Tava de bom tamanho colocar uns robô trampando período integral pra checar os artigo da lei que o malandro se enquadra. E pimba! “Inocente”, “Culpado”. Já era!

Um top que chega onde tu chegou devia ter um bocadinho de massa cerebral pra verificar com precisão quem é o elemento. Tipo dar uma checada no histórico do malévolo. Pra tua informação, o capeta que tu liberou tem nas costas uma ficha recheada de bandidagem que tu, do alto da tua empáfia jurídica, passou batido. 

Tu nem se dignou verificar na capa do processo quem era esse rapper do mal. Deu só uma zoiada por cima, viu que tinha umas inconsistências nos auto, uns furo processual, faltou umas vírgulas na redação e pronto, decidiu que o cara merecia o habea. E botou a serpente na rua pra continuar aprontando, pouco se lixando com os nego que vai ser apagado ou cair na desgraça da droga em consequência da tua sentença embaçada. Claro, um boiola com escolta particular, protegido num condomínio murado de luxo, tá nem aí com o que rola solto nas quebradas onde rasteja o povaréu.

Quem sou eu, um gajo enxerido e pouco letrado, pra dar pitaco prum bacanaço que nem tu? Mas no teu lugar eu não ia dormir direito sabendo que o gatuno que tu colocou de volta às ruas vai prosseguir sua carreira nefasta de fabricar presunto, vender bagulho, sequestrar e estourar agências bancárias. O meliante tem carango zero-bala, helicóptero, lancha, tudo pago com as verdinhas do crime, as mesma que molha a mão dos escritórios atapetado de advocacia para encontrar brechas na lei e convencer os togados que os cliente são gente boa.

Eu não manjo de Direito mas saco bem o que é JUSTIÇA.  Meus pais que sempre levaram vida reta e as tias da escola primária me explicaram de criança o certo e o errado.  Não precisei entrar numa universidade de boyzinho pra sacar quem é sangue bom e quem é filho da puta nesse mundão.

Acho, no sério, que já nasci sabendo. Acredito que o homem vem limpo pro mundo. As coisas correta Deus já coloca no coração da gente quando nasce. A sociedade e as más influências é que corrompe a criatura. Por isso que tem uns que seguem uns rumos meio torto por aí. Esses vão pro caminho do crime ou vão fazer faculdade de Direito e tentar uma vaga no STF.

Penso que a tua patota que se forma em Direito e conhece as artimanha legal tinha obrigação moral de ser mais “direita” que os migué. Mas é o contrário. São os primeiro a defender as mamatas da curriola, e fazer pouco das “injustiças” social que não se avista lá do alto da torre de marfim onde vivem encastelados.

E ocê ainda tem a cara de pau de justificar pras rádio tua cagada sem noção. Guarda tua voz empostada de almofadinha esnobe que nunca passou necessidade na vida. Nem prestei atenção nas abobra que tu falou pois já tenho uma opinião formada sobre a treta. Pouco me interessa as minúcias do artigo x da lei y que tem o parágrafo z sobre a 2ª instância patati patatá. Foda-se! 

Não quero saber! O que interessa é que um malandro vazou pela porta da frente da prisão abraçado com o bota-fora comparsa, deixando com cara de bundão os otários que dá duro e acha que vale a pena ser trabalhador honesto. Assim que o larápio se viu na libertina, pegou o jatinho particular e na maciota escafedeu-se pra outra freguesia. Legalmente. Com a grife da sentença do juiz da mais alta corte do país que não viu ‘culpa formada’ naquele jeremias de araque.

Qual é a tua, ô bundão? Botou fé na lábia do delinquente? Achou mesmo que o bom moço do PCC ia ficar comportadinho na sala de jantar com a patroa assistindo novela? Se quiserem por o bracelete nele de novo vão ter que ralar e gastar uma grana preta que podia ser usada nas merenda escolar, nos posto de saúde e prá tirar uma pá de gente da pindaíba. Mas, lógico, isso não é problema do honorável decano Marco Aurélio, o implacável ministro bunda mole cumpridor das leis. 

O que eu tô mais preocupado é no que pensam nossas crianças. Que esculacho de Brasil varzeano tamo deixando para molecada? Um país que o chefão duma quadrilha barra pesada é considerado INOCENTE pela nossa respeitável elite togada. Acho que nem a máfia gringa conseguiu tanto. Que incentivo a garotada vai ter para crescer responsa? 

O tiozinho da padoca resumiu tudo: “Os mesmos engravatados da lei que pegam pesado com os ladrão de galinha que apodrecem na cadeia, falam fino com os barão do crime, os sonegadores e os políticos corruptos.” 

Eu com os meus botão fiquei pensando. Preferia que o tiozinho da padoca tivesse ocupando tua cadeira nessa tribuna de bosta. Esses são os heróis que eu boto fé: gente do povão, pessoas simples e corretas que metem os peitos na batalha pelo pão das criança. O maior desejo dessa gente é botar os guris numa escola boa pra subir na vida e ser aquilo que os pais não conseguiram ser. Não tem grande ambição. Jamais vão descolar um bico no Judiciário ou na Assembleia Legislativa, ganhando 100 vezes mais que um professor, trabalhando quase nada e dando uma banana pros desempregados que penam nas favelas ou mendigam uns trocado pelas bocas e becos desse país desigual. 

Mas tenho certeza que a maioria dessas pessoas humildes e sem estudo tem melhor noção do que significa Justiça do que a gangue do Judiciário. Que ocê tão bem representa, seu juizeco babaca.

E, data vênia, meritíssimo, antes que eu me esqueça: vá procurar tua turma! 

domingo, 22 de novembro de 2020

Supremos Erros; medidas inconstitucionais do STF; livro; Antonio Jorge Pereira Júnior, Milton Vasconcelos Barbosa (orgs)

 "Supremos Erros": juristas apontam decisões inconstitucionais do STF.


Ministros do STF se consideram "guias iluminados" e sufocam outros poderes; indicação de Kássio Marques é exemplo disso. Leonardo Desideri para a Gazeta do Povo:


Em 2020, muitos brasileiros sabem de cor a lista dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), e a recente escolha de um novo juiz para a corte foi o centro do debate público no Brasil durante dias. Mas o cenário era diferente duas décadas atrás. O STF só se tornou popular no noticiário e nas rodas de conversa a partir de 2002, quando o julgamento sobre o caso do Mensalão começou a transformar os juízes em celebridades.

Para os juristas Antonio Jorge Pereira Júnior e Milton Vasconcelos Barbosa, organizadores da coletânea “Supremos Erros: decisões inconstitucionais do STF”, lançada nesta sexta-feira (20), a ascensão dos ministros do STF ao estrelato foi o ponto de partida para a decadência do trabalho da corte. “O que nos motivou foi o incômodo de perceber que o Supremo tem ampliado cada vez mais uma ação exorbitante das suas competências. Passou do ativismo judicial para um autoritarismo judicial”, diz Pereira Júnior, sobre as causas que levaram à publicação do livro.

É essa extrapolação de competências que é analisada nos 16 capítulos do livro, cada um sobre um caso em que há evidência de abuso do STF. Temas como o inquérito das fakes news, a união homoafetiva, as pesquisas com células-tronco embrionárias, o aborto de anencéfalos e a criminalização da homofobia são abordados pelos 26 autores que participam da coletânea, entre eles o jurista Ives Gandra Martins.

A obra, que foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), está sendo lançada em formato digital pela editora Fundação Fênix e pode ser obtida gratuitamente por meio deste link. O prefácio é do jurista e ex-presidente da República Michel Temer.

“Chegou-se a um limite em que é importante a sociedade fazer um exame dessas atitudes progressivas que têm acontecido na corte suprema, para que ela possa voltar aos limites próprios que a Constituição define para sua ação institucional”, afirma Pereira Júnior, para quem há “uma interferência abusiva sobre o Legislativo, o Executivo e sobre a própria Constituição” por parte dos ministros do STF.

“Supremos Erros” busca mostrar as falhas técnicas e de lógica que evidenciam tanto uma tendência ao corporativismo dentro da corte como um direcionamento ideológico das decisões, que deixaram de se apoiar na Constituição. “Eles estão se acostumando à arbitrariedade, a moldar a realidade como eles acham que ela deve ser, e usurpando o poder constituinte, que é o poder de representação do povo brasileiro”, observa o organizador da coletânea.

Na apresentação da obra, os organizadores dizem que os ministros se veem como “guias iluminados para um futuro mais justo”, capazes de trazer luz a “pontos obscuros da sociedade brasileira, que precisariam de modernização”. Com essa pretensão, a corte busca substituir o Poder Legislativo, o Executivo e o próprio eleitorado, “formando uma espécie de geist insondável da ‘democracia brasileira’”, que não pode ser contido por nenhum mecanismo.

Algumas declarações de atuais ministros evidenciam essa tendência. O ministro Luís Roberto Barroso, por exemplo, disse em palestra na UFMG em 2017 que a corte tem o papel iluminista de “empurrar a história”, promovendo “certos avanços sociais, mesmo contra o sentimento majoritário, em casos como o das uniões homoafetivas”. Em julho de 2020, Dias Toffoli, então presidente do STF, disse em entrevista que os membros da corte são “editores de um país inteiro, de uma nação inteira, de um povo inteiro".

Para Pereira Júnior, a recente escolha do ministro Kássio Nunes Marques, que contrariou a própria vontade inicial do presidente Jair Bolsonaro de indicar um jurista conservador para a corte, é um exemplo de como o autoritarismo judicial do STF sufoca os outros poderes para impor uma visão de mundo. “O STF vai boicotando e bloqueando o governo. Partidos pequenos, que não têm força política no Congresso Nacional, usam o STF direto para bloquear o governo. Como lá dentro está cheio de ministros que se identificam ideologicamente com partidos de esquerda, eles vão referendando”, diz.

Um dos autores que participam da coletânea, o jurista André Gonçalves Fernandes, pós-doutor em Filosofia do Direito pela Unicamp e professor-visitante da Universidade de Navarra (Espanha), vê uma retroalimentação entre o vácuo do Poder Legislativo – que não tem exercido adequadamente suas funções –, e o ativismo judicial do STF.

Segundo ele, “muitos coletivos passaram a explorar isso como uma maneira de fazer prevalecer as suas pautas, contornando o caminho natural da deliberação legislativa”. Entre esses grupos estão partidos como o Psol e entidades feministas e abortistas. “Todos já descobriram que ali [no STF] é o caminho mais rápido”, afirma.

No fim, o STF deixa o seu papel de salvaguarda da Constituição e se reveste da função de pautar o futuro do País. “O juiz se coloca em uma posição de profeta, com uma espécie de messianismo político, antevendo um futuro político-judicial. A partir disso, ele pauta a decisão dele em um sentido ou outro. E isso não é função de magistrado. Isso é função de leitor de tarô, da Mãe Diná, coisas do gênero. A função do ministro do Supremo é ser intérprete da Constituição”, afirma Fernandes.